A violonista espanhola Anabel Montesinos mostra sua versão da música latino americana no CD ‘Alma Llanera’. O repertório traz desde Sergio Assad a Villa-lobos passando Astor Piazzolla, Augusto Barrios, Ariel Ramirez, Marco Pereira, Benito Canonico, Guinga e Pedro Elías Gutiérrez
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O irmão da espuma, das garças, das rosas, e do Sol
por Sidney Molina
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Bastam poucos compassos de escuta atenta para considerar Anabel Montesinos uma violonista incontornável, alguém cuja arte merece repetidas visitas, cada uma revelando novos aspectos: são camadas de articulações, contrastes dinâmicos desenhados, fluência rítmica, fidelidade estilística – tudo envolvido por uma sonoridade de rara beleza, profunda, e que se mantém plena mesmo nas passagens mais virtuosísticas.
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Neste álbum, Llama dedicado à música da América Latina, Montesinos extrai sentidos inauditos de uma coleção de peças curtas, todas em movimento único, e que se situam próximas – a despeito de sua sofisticação – das raízes populares de México, Brasil, Venezuela, Paraguai e Argentina.
A busca de um fundamento guitarrístico da cultura latino-americana passa, necessariamente, pelo violonista-compositor paraguaio Agustín Barrios (1885-1944). Barrios viajou incessantemente pelo continente, absorvendo e disseminando influências até sua morte em San Salvador. Sua presença no álbum é uma espécie de autoconsciência do violão latino, que surge e retorna sobre si, de ‘Caazapá’ e ‘Danza Paraguaya’ ao clássico ‘Las Abejas’, para culminar no ‘Vilancico de Navidad’. Se a presença do compositor paraguaio é variada em si mesma, uma gama diversa de autores deste álbum – inclusive em termos geracionais – é proveniente da Venezuela.
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Cada qual responsável por uma única faixa, aqui estão: Pedro Elías Gutiérrez (1870-1954), autor da faixa título, ‘Alma Llanera‘, uma joropo afro-venezuelano com letra original de Rafael Bolívar Coronado (1884-1924); Benito Canonico (1894-1971), compositor da clássica ‘El totumo de Guarenas’; Rodrigo Riera (1923-1999), importante violonista e professor, com o belíssimo ‘Preludio Criollo’; e, finalmente, Antonio Lauro (1917-1986), talvez o mais estabilizado de todos no repertório do instrumento, que comparece com a energética valsa ‘El Marabino’.
Da Argentina, Montesinos interpreta a ‘Balada para Martin Fierro’ de Ariel Ramirez (1921-2010) e, de seu contemporâneo Astor Piazzolla (1921-1992), o ‘Invierno Porteno’ (na já célebre versão de Sérgio Assad). O violonista Cacho Tirao (1941-2007), autor da ‘Milonga de Don Taco’, integrou o quinteto de Piazzolla e gravou 36 discos entre 1971 e 2006.
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Ponce (1882-1948) não está aqui incluído por suas elaboradas sonatas ou temas com variações, mas pelas mais despretensiosas ‘Três Canciones’ populares mexicanas (‘La Pajarera’, ‘Por tí mi corazón’ e ‘La Valentina’).
É digna de celebração a profunda incursão de Anabel Montesinos pela música brasileira no presente trabalho. De Villa-Lobos (1887- 1959) a Sergio Assad (1952) – o mais jovem do álbum, autor de ‘Valseana’, o segundo movimento da suíte ‘Aquarelle’ – são seis os compositores representantes do violão brasileiro, o que inclui quatro nomes extremamente atuantes no panorama atual do instrumento.
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Villa-Lobos recebe interpretações de dois de seus clássicos ‘Cinco Prelúdios para Violão’ (os no 5 e no 2), mas a terceira peça do mestre carioca gravada por Montesinos merece comentário adicional: trata-se de ‘A maré encheu’, extraída do Guia Prático, coleção de 137 canções folclóricas (com as respectivas letras), publicada originalmente em 1932, em harmonizações para piano, tendo em vista uma finalidade didática. ‘A maré encheu’ aparece como item no 76 da coletânea.
Da eminente geração de violonistas compositores nascida no Brasil no ano 1950, a violonista espanhola apresenta: o esfuziante ‘Bate-Coxa’ (de Marco Pereira); a ‘Carta de pedra’, de Carlos Althier de Sousa Lemos Escobar (unanimemente conhecido como Guinga), uma tristíssima canção com letra original de Aldir Blanc (1946-2020) – nome central da música e poesia popular brasileira vitimado pela covid19 –, aqui em versão instrumental; e ‘Um amor de valsa’, de Paulo Bellinati. Não é preciso nenhuma explicação adicional (além da própria ordem das faixas) para perceber a conexão direta entre a valsa de Bellinati e ‘Uma valsa e dois amores’, de Dilermando Reis (1916-1977): o tema que abre a peça de Reis vem explicitado como citação nos compassos finais de Bellinati.
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Na letra de ‘Alma Llanera’, canção venezuelana que inspirou o título deste CD, diz-se: “Soy hermano de la espuma / De las garzas, de las rosas / Y del Sol” (“Sou irmão da espuma / Das garças, das rosas / E do sol”). É com a suavidade da espuma, a nobreza das garças, o aroma das rosas e o brilho solar que Anabel Montesinos se apresenta em seu primeiro álbum exclusivo para a GuitarCoop.
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DISCO ‘ALMA LLANERA’ • Anabel Montesinos • Selo GuitarCoop • 2023
Músicas /compositores
1. Caazapá (Aire Popular Paraguayo). (Agustin Barrios)
2. Invierno Porteño (Astor Piazzolla)
3. Danza Paraguaya (Agustin Barrios)
4. A maré encheu (GuiaPrático). (Heitor Villa-Lobos)
5. Las Abejas (Agustin Barrios)
6. Balada para Martin Fierro (Ariel Ramirez)
7. Valseana (Sergio Assad)
8. Milonga de Don Taco (Cacho Tirão)
9. Prelúdio V (Heitor Villa-Lobos)
10. Prelúdio criollo (Rodrigo Riera)
11. Um amor de valsa (Paulo Pellinati)
12. Uma valsa e dois amores (Dilermando Reis)
13. Prelúdio II (Heitor Villa-Lobos)
14. Trés canciones populares mexicanas (Manuel Ponce)
15. Bate-coxa (Marco Pereira)
16. El Marabino (Antonio Lauro)
17. Aire de Joropo (El totumo de Guarenas). (Benito Canonico)
18. Alma llanera (Pedro Elias Gutiérrez)
19. Villancico de navidad (Agustin Barrios)
20. Carta de pedra (Guinga)
– ficha técnica –
Anabel Montesinos – violão solo | Produção musical: Thiago Abdalla | Gravado na Fazenda Boa Vista (S. Paulo/dezembro/2021) | Montagem: Felipe Silotto e Thiago Abdalla | Mixagem e masterização: Ricardo Marui | Texto de apresentação/encarte: Sidney Molina | Design gráfico: Eduardo Sardinha | Fotos: Giuliano Belotti | Violão: Steve Connor, 2018 | Cordas: Savarez Cantiga Alliance Premium, Alta Tensão | Microfones: DPA 2006, Royer SF 24, Neumann KM 184 | Assessoria de imprensa: Moisés Santana/Tambores Comunicações | Selo: GuitarCoop | Distribuição digital: Tratore | Formato: CD digital / físico | Ano: 2023 | Lançamento: 17 de março | ♪Ouça o álbum: spotify / Apple music / Deezer / Youtube | ♩compre o disco: clique aqui.
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>> Siga: @anabelmontesinos | @guitarcoop_oficial
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SOBRE ANABEL MONTESINOS
Nascida na Espanha, Anabel Montesinos foi a mais jovem vencedora do Concurso Internacional de Violão Francisco Tárrega na Espanha, aos 17 anos de idade. Estreou no Carnegie Hall em 2011 e foi solista junto a importantes orquestras como a Filarmônica de Turim (Itália), Filarmônica Simon Bolívar (Venezuela) e Filarmônica de Moscou. Suas interpretações são reconhecidas pela beleza de sua sonoridade e virtuosismo. Já ganhou mais de 10 primeiros prêmios em grandes concursos de violão, como o Michele Pittaluga, Citá di Alessandria, na Itália, o Julián Arcas, na Espanha, o Raifeisenwettbewerb, em Salzburg, Áustria, entre outros. Como concertista, já se apresentou em algumas das principais salas de concerto do mundo.
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Anabel é cidadã de honra da cidade de Solero, na Itália. Em 2011 ela ganhou o “Premio Chitarra D’Oro” como promissora jovem talento e reconhecimento de suas atividades artísticas, no Convegno Internazionale di Chitarra, em Alessandria. Anabel Montesinos gravou para o selo Naxos, e seu primeiro CD foi escolhido como parte do programa musical para vôos intercontinentais pela British Airways. Seus álbuns foram elogiados pela imprensa internacional destacando a beleza, frescor e virtuosismo de suas interpretações.
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fonte: violão brasileiro
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Série: Discografia da Música Latino-americana / Música instrumental / álbum.
* Publicado por ©Elfi Kürten Fenske