“Quem experimenta a beleza está em comunhão com o sagrado”
– Rubem Alves, em “300 Pílulas de Sabedoria”. São Paulo: Planeta, 2015.
‘A beleza, mais uma vez, provoca o meu pensamento, há duas maneiras de enxergá-la: em sua forma objetiva, isto é, a realidade externa se revela aos sentidos e, independente do gosto de cada pessoa, se impõe como bela. Concordamos, sem questionar, com uma cultura hedonista que aguça o pensamento e ações ditando o que é bom e belo. Nesta abordagem, a beleza é externa, vem de fora, e tem um caráter autoritário. A outra forma da beleza é própria da subjetividade, pertence ao mundo interior, é coisa da alma que busca o que não se revela, o escondido, o mistério por traz das aparências. A beleza, sob esta ótica, não se concentra no objeto, vai além, apesar de refletir nele a liberdade e a alegria. É coisa de quem, mesmo em dias tristes, se aventura a buscar outra beleza; de quem não se contenta com as aparências; de quem só vê as belezas do mundo porque há beleza dentro de si. Ter prazer é bom, mas não o prazer que nos faz perder a alegria.’ – José Neivaldo de Souza
Sobre a beleza, por Rubem Alves
ALMA NÃO COME PÃO. ALMA come beleza. O pão engorda, faz o corpo ficar pesado. A beleza, ao contrário, faz a gente ficar cada vez mais leve. Não é raro que os comedores de beleza se tornem criaturas aladas e desapareçam no azul do céu, onde moram os deuses, os anjos e os pássaros. A beleza é coisa da leveza.
Há dois tipos de beleza.
O primeiro é a beleza que os deuses oferecem aos homens como dádiva. Ela cai dos céus, à semelhança do maná. A segunda é a beleza que os homens oferecem aos deuses como dádiva. Ela sobe da terra aos céus, como fumaça ou bolhas de sabão.
Conhece-se a beleza dádiva dos deuses por aquilo que ela produz na alma dos homens. Quem é possuído por ela entra em êxtase: cessa o riso, cessa o choro, o pensamento para, a fala emudece. É mística. A alma está tomada pela felicidade da tranquilidade absoluta. Era assim que se sentia o Criador ao contemplar, ao final de cada dia de trabalho, o resultado da sua obra: “Está muito bom! Do jeito como deveria ser! Nada há a ser modificado! Amém!”.
– Rubem Alves, no livro “Pimentas – para provocar um incêndio, não é preciso fogo”. {contos} Editora Planeta, 2012.
Rubem Alves – o aprendiz de feiticeiro
Rubem Alves (Crônicas, contos e afins)
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