“Os seres humanos me assombram.”
“Com absoluta sinceridade, tento ser otimista a respeito de todo esse assunto, embora a maioria das pessoas, sinta-se impedida de acreditar em mim, sejam quais forem os seus protestos. Por favor, confie em mim. Decididamente eu sei ser animada, sei ser amável. Agradável. Afável. E esses são apenas os “as”. Só não me peça para ser simpática. Simpatia não tem nada a ver comigo.”
– Markus Zusak, no livro “A Menina Que Roubava Livros”. [tradução Vera Ribeiro]. Rio de Janeiro: Editora Intrinseca, 2007, p. 9.
“A menina que roubava livros”: um canto à humanidade
Reflexões sobre o filme baseado no livro de Markus Zusak
– Jesús Sanz Montes*
“A menina que roubava livros” é um filme repleto de mensagem. Está baseado no livro homônimo de Markus Zusak (2005) e reconstrói as pequenas histórias anônimas dentro da grande história conhecida.
Em meio a uma guerra cruel, dá-se um relato de humanidade verdadeira. O pano de fundo é a barbárie nazista da 2ª Guerra Mundial. As pinceladas do totalitarismo sem sentido são suficientemente sugeridas pelo ataque à dignidade da pessoa, pela sua própria existência colocada em jogo, devido à ideologia que um louco conseguiu instaurar com o incompreensível aplauso e adesão de quase toda a nação.
Também são mostrados alguns traços menores que igualmente descrevem aquela tragédia enorme que causou tantas vítimas em nome do nada mais vazio. Lá, aparece o medo, a violência, a mentira, a demagogia, a inveja, a conspiração, a fuga.
Mas, em meio a toda esta terrível descrição, diante da qual nunca nos acostumamos, surge esta pequena história que, como um imenso contraponto, é capaz de vencer a batalha contra toda esperança, porque o amor é mais forte que a morte, como afirma o livro do Cântico dos Cânticos.
Há três histórias de amor simples, cheio de verdade e ternura, dessa ternura que salvará o mundo, como dizia o grande escritor e teólogo russo Pavel Evdokmov. Em primeiro lugar, está o amor de uma família que, dentro de sua extrema precariedade, acolhe em seu pobre lar uma menina.
A ternura dos que já tiveram de desempenhar o papel de pai e mãe emprestados, ainda dentro dos seus matizes temperamentais diferentes, é uma flor que de repente confere cores ao deserto. É também o amor de duas crianças, Liesel e Rudi, que, em sua pureza sem ambiguidade, são capazes de acompanhar-se com seus sonhos e brincadeiras infantis, acima dos trágicos pesadelos dos adultos.
Finalmente, é o amor da menina protagonista, Liesel, às letras, palavras e livros, que resgata ou pega emprestados, que vai escrevendo sua própria biografia, no livro da vida inacabada. É uma constante na história dos humanos que os amigos das barbáries, da violência, são também inimigos da vida e da verdadeira cultura. Temos exemplos bem próximos.
Mas há uma cena particularmente significativa que me comoveu e que acaba sendo o grande encanto deste filme. Os soldados nazistas estão detendo um pobre homem judeu. Ele era do povo, morava naquela rua do Céu (Himmelstrasse), havia nascido lá e todos o conheciam e apreciavam.
Mas, pelo fato de ser judeu, sua condição alemã ficou manchada e os bárbaros decidiram eliminá-lo. É então que o pai de Liesel entra em ação, para defendê-lo como um simples concidadão. A agressão brutal que ele sofre por este gesto o deixa no chão, com a cabeça golpeada. Por que fizeram isso? E esta é a resposta que se dá: porque ele lhes recordou sua humanidade.
A cena é impressionante, por sua qualidade humana e ao mesmo tempo pela sua violência. Recordar a beleza, a bondade, a verdade, para as quais nascemos, pode ser revolucionário. E este é o sofrimento de tantas pessoas censuradas, perseguidas e eliminadas. Este é o sofrimento dos cristãos.
Recordar a humanidade da qual fomos feitos é uma maneira de testemunhar o Criador que nos fez sem renunciar ao destino que Ele nos deu.
* Artigo de Dom Jesús Sanz Montes, arcebispo de Oviedo (Espanha), publicado originalmente por SIC. Tradução site Alteia.
“Não ir embora: ato de confiança e amor, comumente decifrado pelas crianças.”
– Markus Zusak, no livro “A Menina Que Roubava Livros”. [tradução Vera Ribeiro]. Rio de Janeiro: Editora Intrinseca, 2007.
“Uma verdadezinha. Eu não carrego gadanha nem foice. Só uso um manto preto com capuz quando faz frio. E não tenho aquelas feições de caveira que vocês parecem gostar de me atribuir à distância. Quer saber a minha verdadeira aparência? Eu ajudo. Procure um espelho enquanto eu continuo.”
– Markus Zusak, no livro “A Menina Que Roubava Livros”. [tradução Vera Ribeiro]. Rio de Janeiro: Editora Intrinseca, 2007, p.271.
O FILME
A Menina que Roubava Livros (The Book Thief)
Sinopse: Adaptação de A Menina que Roubava Livros, do australiano Markus Zusak, o filme acompanha a história de Liesel Meminger (interpretada pela canadense Sophie Nélisse. Durante a Segunda Guerra Mundial, Liesel e seu irmão são deixados pelos pais e adotados por um casal vivido por Geoffrey Rush (O Discurso do Rei) e Emily Watson (Anna Karenina). O garoto morre no trajeto e é enterrado por um coveiro que deixa cair um livro na neve. Ela aprende a ler com o incentivo de sua nova família e Max, um judeu refugiado que eles escondem baixo às escada. Para Liesel e Max, o poder das palavras e da imaginação se transformam em escape dos tumultuosos eventos que acontecem ao seu redor. Em meio ao caos, a jovem encontra refúgio na literatura para sobreviver. Ajudada por seu pai adotivo, ela passa a roubar livros e descobrir neles a esperança perdida durante a guerra.
Gênero: Drama, Guerra
Origem: Estados Unidos, Alemanha
Ano: 2014
Duração: 131 min.
Direção: Brian Percival
Roteiro: Markus Zusak, Michael Petroni
Produção: Karen Rosenfelt, Ken Blancato
Fotografia: Florian Ballhaus
Trilha Sonora: John Williams
Estúdio: Fox Film, Studio Babelsberg Motion Pictures
Montador: John Wilson
Distribuidora: Fox Film do Brasil
Elenco: Barbara Auer, Beata Lehmann, Ben Schnetzer, Carina N. Wiese, Carl Heinz Choynski, Emily Watson, Geoffrey Rush, Gotthard Lange, Heike Makatsch, Hildegard Schroedter, Julian Lehmann, Kirsten Block, Levin Liam, Ludger Bökelmann, Matthias Matschke, Nico Liersch, Nozomi Linus Kaisar, Oliver Stokowski, Paul Schaefer, Rafael Gareisen, Rainer Bock, Rainer Reiners, Robert Beyer, Roger Allam, Sandra Nedeleff, Sebastian Hülk, Sophie Nélisse
Classificação: 12 anos
Assista abaixo o trailer “A Menina que Roubava Livros”* | Legendado HD | 2014
* Disponível dublado no Youtube.
“No cômputo final, ela possuía quatorze livros, mas via sua história como predominantemente composta por dez deles. Desses dez, seis foram roubados, um apareceu na mesa da cozinha, dois foram feitos para ela por um judeu escondido, e um foi entregue por uma tarde suave, vestida de amarelo.”
– Markus Zusak, no livro “A Menina Que Roubava Livros”. [tradução Vera Ribeiro]. Rio de Janeiro: Editora Intrinseca, 2007, p. 31.
“Quando a Morte conta uma história, você deve parar para ler”
O LIVRO
ZUSAK, Markus*. A Menina Que Roubava Livros. [tradução Vera Ribeiro; ilustrações Trudy White]. Rio de Janeiro: Editora Intrinseca, 2007. {Titulo original: The Book Thief. Markus Zusak. Illustrator Trudy White. Published by Picador (Australia) in 2005}.
A trajetória de Liesel Meminger é contada por uma narradora mórbida, surpreendentemente simpática. Ao perceber que a pequena ladra de livros lhe escapa, a Morte afeiçoa-se à menina e rastreia suas pegadas de 1939 a 1943. Traços de uma sobrevivente: a mãe comunista, perseguida pelo nazismo, envia Liesel e o irmão para o subúrbio pobre de uma cidade alemã, onde um casal se dispõe a adotá-los por dinheiro. O garoto morre no trajeto e é enterrado por um coveiro que deixa cair um livro na neve. É o primeiro de uma série que a menina vai surrupiar ao longo dos anos. O único vínculo com a família é esta obra, que ela ainda não sabe ler.Assombrada por pesadelos, ela compensa o medo e a solidão das noites com a conivência do pai adotivo, um pintor de parede bonachão que lhe dá lições de leitura. Alfabetizada sob vistas grossas da madrasta, Liesel canaliza urgências para a literatura. Em tempos de livros incendiados, ela os furta, ou os lê na biblioteca do prefeito da cidade.
A vida ao redor é a pseudo-realidade criada em torno do culto a Hitler na Segunda Guerra. Ela assiste à eufórica celebração do aniversário do Führer pela vizinhança. Leia mais no site da editora!
“Mas Rudy Steiner não pôde resistir a um sorriso. Em anos vindouros, ele seria um doador de pão, não um ladrão — mais uma prova de como o ser humano é contraditório. Um punhado de bem, um punhado de mal. E só misturar com água.”
– Markus Zusak, no livro “A Menina Que Roubava Livros”. [tradução Vera Ribeiro]. Rio de Janeiro: Editora Intrinseca, 2007, p. 150.
“[…] aquelas eram as mais pobres almas ainda vivas […] Seus rostos macilentos esticavam-se pela tortura. A fome os devorava, enquanto eles seguiam em frente, alguns olhando para o chão, para evitar as pessoas […] Alguns lançavam olhares súplices para os que tinham ido observar sua humilhação […] Outros imploravam que alguém qualquer um, desse um passo à frente e os tomasse em seus braços.”
– Markus Zusak, no livro “A Menina Que Roubava Livros”. [tradução Vera Ribeiro]. Rio de Janeiro: Editora Intrinseca, 2007, p. 341.
“Foram jogando tudo para cima. Quando mais um pedaço de parede partida foi retirado, um deles viu o cabelo da menina que roubava livros. O homem deu uma risada de puro prazer (…). Houve uma grande alegria entre os homens que gritavam em algazarra, mas não pude compartilhar inteiramente de seu entusiasmo. Antes disso eu havia segurado o papai dela num braço e sua mamãe no outro. Duas almas muito suaves.”
– Markus Zusak, no livro “A Menina Que Roubava Livros”. [tradução Vera Ribeiro]. Rio de Janeiro: Editora Intrinseca, 2007, p. 432.
Crítica ao livro em jornais e revistas
“Brilhante e altamente ambicioso… Há quem diga que um livro tão difícil e triste não seja adequado para adolescentes… Adultos provavelmente gostarão (este aqui gostou), mas é um grande romance jovem-adulto… É o tipo do livro que pode mudar a vida (…).”
– The New York Times
“A menina que roubava livros é perturbador, nada sentimental e, ainda assim, essencialmente poético. A crueldade e a tragédia perpassam a mente do leitor como um filme preto-e-branco, destituído das cores da vida. Zusak pode não ter vivido sob a dominação nazista, mas A menina que roubava livros merece um lugar na mesma prateleira de Diário de Anne Frank e de A noite, de Elie Wiesel. Parece fadado a se tornar um clássico.”
– USA Today
“O amor pelos livros conduz e sustenta a engenhosa estrutura do romance.”
– O Globo
“A leveza com que crianças e adolescentes atravessam um dos períodos mais dramáticos da História é um dos trunfos desse belo livro.”
– Época
Sobre o autor do livro
* Markus Zusak nasceu em 1975 em Sydney, Austrália, onde mora até hoje. Tem cinco livros publicados: o best-seller A menina que roubava livros, Eu sou o mensageiro (ambos pela editora Intrínseca), The underdog, Getting the girl e Fighting Ruben Wolfe.
Fonte das informações sobre o livro: Editora Intrínseca
“Uma pequena teoria: as pessoas só observam as cores do dia no começo e no fim, mas para mim, está muito claro que o dia se funde através de uma multidão de matizes e entonações, a cada momento que passa. Uma só hora pode consistir em milhares de cores diferentes. Amarelos céreos, azuis borrifados de nuvens. Escuridões enevoadas. No meu ramo de atividade, faço questão de notá-los.”
– Markus Zusak, no livro “A Menina Que Roubava Livros”. [tradução Vera Ribeiro]. Rio de Janeiro: Editora Intrinseca, 2007.
“O ser humano não tem um coração como o meu. O coração humano é uma linha, ao passo que o meu é um círculo, e tenho a capacidade interminável de estar no lugar certo na hora certa. A consequência disso é que estou sempre achando seres humanos no que eles têm de melhor e pior. Vejo sua feiura e beleza, e me pergunto como uma mesma coisa pode ser duas. Mas eles têm uma coisa que eu invejo. Que mais não seja, os humanos têm o bom senso de morrer.”
– Markus Zusak, no livro “A Menina Que Roubava Livros”. [tradução Vera Ribeiro]. Rio de Janeiro: Editora Intrinseca, 2007.
“Tive vontade de dizer muitas coisas à roubadora de livros, sobre a beleza e a brutalidade. Mas que poderia dizer-lhe sobre essas coisas que ela já não soubesse? Tive vontade de lhe explicar que constantemente superestimo e subestimo a raça humana – que raras vezes a estimo (…) tudo o que pude fazer foi virar-me para Liesel Meminger e lhe dizer a única verdade que realmente eu sei. Eu a disse à menina que roubava livros e digo a você agora. Última nota de sua narradora: os seres humanos me assombram.”
– Markus Zusak, no livro “A Menina Que Roubava Livros”. [tradução Vera Ribeiro]. Rio de Janeiro: Editora Intrinseca, 2007, p. 478.