Bernardo Ramos lançou o seu segundo álbum “Poemas para Trio”, pela gravadora Rocinante, ao lado do contrabaixista Bruno Aguilar e do percussionista Reinaldo Boaventura
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Bernardo Ramos é guitarrista, compositor, arranjador e produtor musical. Um dos mais inventivos e inquietos músicos da atual geração brasileira lançou o seu segundo álbum, “Poemas para Trio”, pela gravadora Rocinante. O projeto está disponível em vinil e nas plataformas digitais, e o LP tem capa de uma pintura de Tomie Ohtake, fotos de Lucca Mezzacappa e texto de Marcelo Galter.
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Multiartista, Bernardo tem em seu currículo indicações ao Grammy Latino, como co-produtor do disco Sofia Gubaidúlina, Hermeto Pascoal e Ígor Stravinsky, de Erika Ribeiro, e ao prêmio Shell de Melhor Música com uma composição em parceria com Naná Vasconcelos. Foi ainda o vencedor da edição de 2009 do Festival Instrumental de Guarulhos e dirigiu o concerto em homenagem aos 70 anos de Dori Caymmi no Festival Villa-Lobos.
“Poemas para Trio” surge de um lugar muito próprio de Bernardo: a inquietude constante em explorar novas formas de fazer música. “Desde as composições do meu disco anterior, Cangaço, tenho uma preocupação: não repetir o que já fiz. A composição das peças nasceu antes da ideia de gravar um disco, são resultados parciais da minha busca sem fim”, revela o artista.
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Distinto do seu primeiro disco, em que tocava em quinteto, dessa vez Bernardo se junta a Bruno Aguilar no baixo acústico e Reinaldo Boaventura na percussão. Essa formação singular permite a Bernardo encontrar novos caminhos de textura, inclusive de maior densidade, tanto para a sua guitarra quanto para o conjunto.
“É uma formação muito diferente. A percussão do Reinaldo tem muitos tambores médio-graves e graves, tudo trabalhado com muita atividade. Nós três, junto aos produtores Marcelo Galter e Sylvio Fraga, fomos aprendendo a compartilhar essas regiões de forma poética, e esse processo foi amadurecido no estúdio. Escutar muito o outro, de verdade, e abandonar fórmulas e padrões estabelecidos”, relembra Bernardo. “Poemas para Trio não tem solista, ou tem três solistas em atividade simultânea”, resume.
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Ao longo de seis faixas, o disco percorre tanto as peças autorais de Bernardo, como as músicas de abertura “Contraluz” e “Piano de Barro”, quanto canções como “É doce morrer no mar”, de Dorival Caymmi, e “San Vicente”, de Milton Nascimento e Fernando Brant. “Nos últimos 10 anos tenho perseguido novas formas de tocar as canções que me fazem existir, de modo que soem como um abraço apertado de gratidão a quem as compôs”, explica o músico. Nesses momentos, suas melodias soam como um artesanato e a compreensão das composições traz uma profunda carga emotiva.
O guitarrista foi membro da Itiberê Orquestra Família durante 10 anos, onde gravou três discos e se apresentou nas mais importantes salas de concerto do Brasil e da América Latina. “Acompanho Bernardo Ramos desde 1997, então conheço bem as capacidades rítmica, harmônica, melódica e interpretativa que seu talento abrange — e digo que são ilimitadas”, disse Itiberê Zwarg sobre o músico.
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Desde os 18 anos, Bernardo Ramos é professor de música e muitos dos seus ex-alunos ganharam destaque na cena carioca e no exterior. O magistério é também um exercício particular: “Meus alunos me ensinam a dar aulas para mim mesmo, a aprender como lidar com minhas potências e limitações. Essa é uma arte dificílima, penso. Porém, a mais importante”.
O seu som tem as marcas dos mestres Itiberê e Hermeto Pascoal, unidas a inspirações que vão do jazz ao rock, passando pelo violão clássico e texturas orquestrais. No entanto, Bernardo prefere encarar as referências de outra forma. “Acho que as referências, tanto da música quanto das outras artes aparecem de uma forma muito inconsciente, é como sonhar com o Glauber Rocha tendo os braços da Elis e a cabeça do Ferreira Gullar”, ilustra.
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No novo disco, esse repertório imenso de musicalidade e vivências vem carregado de frescor, numa experiência sonora que expande as composições para uma leitura aberta aos reflexos individuais. “Poemas para Trio é uma aposta no ouvinte, uma convicção de que o que parece desafiador pode ser muito carismático, até mesmo pop, por que não? Quem é que determina o que é acessível? As pessoas gostam de aventura!”, conclui Bernardo.
Poemas para Trio’ | Bernardo Ramos
por Marcelo Galter
Conheci o trabalho de Bernardo Ramos numa apresentação em quinteto tocando o repertório do seu primeiro disco, Cangaço, para uma plateia desavisada, que mesmo esperando uma música ligada à tradição dos standards, saiu inflamada pelo calor e ousadia daquele conjunto. Aquela música me chamou atenção por não ter pudor nenhum em misturar influências da tradição cancioneira popular com procedimentos da dita música pós-tonal.
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Este é o segundo disco solo de Bernardo e é fácil perceber que os seus ouvidos continuam abertos: a sua natureza é de fazedor, de um descobridor que mergulha fundo nas inquietações e intuições. Este trabalho é uma oportunidade de vê-lo se abrir generosamente para o inesperado, doando suas geniais composições para o deleite do seu trio.
Recém-formado, o trio me convidou para assistir a um ensaio. Eles já estavam se embicando em algumas sessões, como diz o Bernardo e, a essa altura, o conjunto já estava com o material composicional desvendado, seguindo com o firme propósito de expandir aquelas composições para uma leitura aberta a todos os reflexos individuais e a todas as forças que atuam na conexão entre eles.
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Com esse trio singular, uma insuspeitada ideia pode lentamente chegar em cada ensaio, tomar forma e ser desfrutada por todos, ou simplesmente gerar possibilidades para abandoná-la por completo, como uma nova folha em branco que surge esperando o momento mágico em que será preenchida por novos poemas.
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Após receber com enorme honra o convite para participar como produtor musical juntamente com Sylvio Fraga, acompanhei todos os ensaios. Mesmo sem empunhar o meu instrumento, o trio me acolheu como parte do conjunto e o meu envolvimento foi de quem já estava tocando ali.
Em Poemas para trio, a despeito de uma formação mais reduzida, Bernardo encontra novos caminhos de textura, inclusive maior densidade, tanto para a guitarra quanto para o conjunto. Esse trio, que já é uma formação rara na música instrumental brasileira, soa trio-orquestra. Na intenção da tocada, me parece que os instrumentos não querem receber seus nomes, nem mesmo propor as tão aclamadas trocas de personagens (guitarra percussiva, percussão melódica, contrabaixo sei lá o quê). A música que eles fazem segue interessada em coesão, numa interação livre e orgânica, sem levar a sério os já tradicionais papéis de atuação.
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Bernardo traz em sua bagagem espiritual um envolvimento profundo com o aspecto melódico da música. Suas composições mais arrojadas (território onde brinca com seu grupo propondo jogos que instigam a quebra de condicionamentos) fluem sempre na direção do que pode ser entoado pela voz humana. Quando inclui no repertório do disco canções como É doce morrer no mar e San Vicente, esse lirismo transborda em suas improvisações e interpretações, revelando o guitarrista-cantor singular, mestre no artesanato de melodias e com uma compreensão profunda da carga emotiva dessas composições.
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Bernardo, Bruno e Rei se juntaram sortudamente, com os ouvidos atentos para reconhecer a encantadora distância que existe entre o som e a escrita do som. Exímios compositores e improvisadores fazem chegar até o ouvinte uma música que anseia pelo mistério, como poemas que se esquivam à nossa compreensão para permanecerem em nosso afeto.
— Marcelo Galter.
DISCO ‘POEMAS PARA TRIO’ • Bernardo Ramos / com Bruno Aguilar e Reinaldo Boaventura • Selo Rocinante • 2024
Músicas / compositores
Lado A
1A. Contraluz (Bernardo Ramos)
2A. Piano de barro (Bernardo Ramos)
3A. San Vicente (Milton Nascimento e Fernando Brant)
Lado B
1B. Dois ventos (Bernardo Ramos)
2B. Couro de bode (Bernardo Ramos)
3B. É doce morrer no mar (Dorival Caymmi)
– ficha técnica –
Bernardo Ramos (guitarra) | Participação especial: Bruno Aguilar (baixo acústico) | Reinaldo Boaventura (percussão) | Direção artística: Bernardo Ramos e Sylvio Fraga | Produção musical: Marcelo Galter, Bernardo Ramos e Sylvio Fraga | Direção musical: Bernardo Ramos | Arranjos: Bernardo Ramos, com contribuições de Marcelo Galter nas faixas 2A, 1B e 2B | Gravação: Pepê Monnerat e Arthur Damásio no Estúdio Rocinante | Mixagem/Mistura: Pepê Monnerat no Estúdio Rocinante | Masterização: Götz-Michael Rieth | Coordenação artística: Jhê | Coordenação técnica: Flávio Marcos Batata | Projeto gráfico: Ana Rocha | Fotografias da contracapa: Lucca Mezzacappa | Produção executiva: Luanda Morena | Sobre a capa: A obra reproduzida na capa é de Tomie Ohtake – sem título, 2008 – gravura em metal – 50 x 70 cm – Fotografada por Sergio Guerini – © Tomie Ohtake | Selo: Rocinante | Cat.: R021 | Formato: CD digital / LP | Ano: 2024 | Lançamento: 20 de junho | ♪Ouça o álbum: clique aqui / Bandcamp | ♩LP – vinil: clique aqui.
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>> Siga: @bernardo.ramos.br | @bruno_aguilar_ | @boaventurareinaldo | @rocinantegravadora
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Série: Discografia da Música Brasileira / MPB / Música instrumental / Choro / jazz / Álbum.
* Publicado por ©Elfi Kürten Fenske
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