A poesia confessional de Anne Sexton (edição bilíngue)
A mulher do fazendeiro
O guisado misturado
A lascívia do seu campo,
Sua vida local em Illinois,
Onde todos os acres parecem
Fábricas de vassouras flurescentes:
–já faz agora dez anos
que ela é seu hábito;
e novamente hoje de noite
ele dirá vamos, doçura
e ela não lhe dirá o quanto além disso é preciso
para viver, quanto mais do que esta
breve ponte luminosa
da cama estridente ou ainda
mais do que seus lentos toques em Braille
como os de um pesado deus tornado leve,
esta velha pantomima do amor
que ela deseja, embora
isso continue a deixa-la sozinha ,
mais uma vez de volta a si,
a mente separada da dele, vivendo
a si mesma com suas próprias palavras
e detestando a umidade da casa
que neles permanece quando finalmente jazem
em sonhos separados
e a maneira como ela olha para ele
que está ainda forte no envoltório rubicundo
do seu sono habitual, enquanto dela
os anos jovens se estiolaram na mesma
cama de casal
e ela o deseja aleijado ou poeta,
ou ainda mais, solitário, ou, às vezes,
melhor, meu amado: morto”
.
The farmer’s wife
From the hodge porridge
of their country lust,
their local life in Illinois,
where all their acres look
like a sprouting broom factory,
they name just en years now
that she has been his habit;
as again tonight he’ll say
honey bunch let’s go
and she will not say how there
must be more to living
than this brief bright bridge
of the raucous bed or even
the slow braille touch of him
like a heavy god grown light,
that old pantomime of love
that she wants although
it leaves her still alone,
built back again at last,
mind’s apart from him, living
her own self in her own words
and hating the sweat of the house
they keep when they finally lie
each in separate dreams
and then how she watches him,
still strong in the blowzy bag
of his usual sleep while
her young years bungle past
their same marriage bed
and she wishes him cripple, or poet,
or even lonely, or sometimes,
better, my lover, dead.
– Anne Sexton, em “Antologia da nova poesia norte-americana”. [seleção, tradução e notas de Jorge Wanderley]. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1992.
§
Em celebração do meu útero
Tudo em mim é um pássaro.
Adejo com todas as minhas asas.
Queriam extirpar-te
mas não o farão.
Diziam que estavas incomensuravelmente vazio
mas não estás.
Diziam que estavas doente prestes a morrer
mas estavam errados.
Cantas como uma colegial
Tu não estás desfeito.
Doce peso,
em celebração da mulher que sou
e da alma da mulher que sou
e da criatura central e do seu prazer
canto para ti. Atrevo-me a viver.
Olá, espírito. Olá, taça.
Fixar, cobrir. Cobre o que contém.
Olá, terra dos campos.
Bem-vindas, raízes.
Cada célula tem uma vida.
Há aqui bastantes para satisfazer uma nação.
Chega que a populaça possua estes bens.
Qualquer pessoa, qualquer grupo diria:
Está tudo tão bem este ano que podemos plantar de novo
e pensar noutra colheita.
Uma praga tinha sido prevista e foi eliminada.
Por isso muitas mulheres cantam em uníssono:
uma numa fábrica de sapatos amaldiçoando a máquina,
uma no aquário cuidando da foca,
uma aborrecida ao volante do seu FORD,
uma cobradora na portagem,
uma no Arizona enlaçando um bezerro,
uma na Rússia com uma perna de cada lado do violoncelo,
uma trocando panelas num fogão no Egipto,
uma pintando da cor da lua as paredes do quarto,
uma no seu leito de morte mas recordando um pequeno almoço,
uma na Tailândia deitada na esteira,
uma limpando o rabo ao seu bebé,
uma olhando pela janela do comboio,
no meio do Wyomming e uma está
em qualquer lado e algumas estão em todo o lado e todas
parecem estar cantando, embora haja quem
não possa cantar uma nota sequer.
Doce peso
em celebração da mulher que sou
deixa-me levar uma echarpe de três metros,
deixa-me tocar o tambor pelas que têm dezanove anos,
deixa-me levar taças para oferecer
(se é isso o que me toca).
deixa-me estudar o tecido cardiovascular,
deixa-me calcular a distância angular dos meteoros,
deixa-me chupar o pecíolo das flores
(se é isso o que me toca).
Deixa-me imitar certas figuras tribais
(se é isso o que me toca).
Pois o corpo preciso disso,
que me deixes cantar
para a ceia,
para o beijo,
para a correcta
afirmação.
.
In celebration of my uterus
Everyone in me is a bird.
I am beating all my wings.
They wanted to cut you out
but they will not.
They said you were immeasurably empty
but you are not.
They said you were sick unto dying
but they were wrong.
You are singing like a school girl.
You are not torn.
Sweet weight,
in celebration of the woman I am
and of the soul of the woman I am
and of the central creature and its delight
I sing for you. I dare to live.
Hello, spirit. Hello, cup.
Fasten, cover. Cover that does contain.
Hello to the soil of the fields.
Welcome, roots.
Each cell has a life.
There is enough here to please a nation.
It is enough that the populace own these goods.
Any person, any commonwealth would say of it,
“It is good this year that we may plant again
and think forward to a harvest.
A blight had been forecast and has been cast out.”
Many women are singing together of this:
one is in a shoe factory cursing the machine,
one is at the aquarium tending a seal,
one is dull at the wheel of her Ford,
one is at the toll gate collecting,
one is tying the cord of a calf in Arizona,
one is straddling a cello in Russia,
one is shifting pots on the stove in Egypt,
one is painting her bedroom walls moon color,
one is dying but remembering a breakfast,
one is stretching on her mat in Thailand,
one is wiping the ass of her child,
one is staring out the window of a train
in the middle of Wyoming and one is
anywhere and some are everywhere and all
seem to be singing, although some can not
sing a note.
Sweet weight,
in celebration of the woman I am
let me carry a ten-foot scarf,
let me drum for the nineteen-year-olds,
let me carry bowls for the offering
(if that is my part).
Let me study the cardiovascular tissue,
let me examine the angular distance of meteors,
let me suck on the stems of flowers
(if that is my part).
Let me make certain tribal figures
(if that is my part).
For this thing the body needs
let me sing
for the supper,
for the kissing,
for the correct
yes.
– Anne Sexton [tradução Jorge Sousa Braga*]. in: Poesia Ilimitada, publicado em 21.8.2011.
§
Sonhando com seios
Mãe,
estranho rosto de deusa
sobre a minha casa de leite,
esse delicado asilo,
devorei-te.
Todas as minhas necessidades tragaram-te
como se fosses comida.
O que me deste
recordo-o num sonho:
os braços sardentos envolvendo-me,
o riso algures sobre o meu chapéu de lã,
os dedos de sangue atando os meus sapatos,
os seios suspensos como dois morcegos,
precipitando-se depois sobre mim,
até me dobrar.
Agora os seios que conheci à meia-noite
batem em mim como o mar.
Mãe enchi a boca de abelhas
para evitar comer
e isso não foi nada bom para ti.
Finalmente amputaram os teus seios
e o leite derramou-se
nas mãos do cirurgião
e ele abraçou-os
e eu retirei-lhos
e plantei-os.
Coloquei-te um cadeado,
mãe, querida morta humana,
para que as tuas grandes campânulas,
aqueles queridos póneis brancos,
possam galopar, galopar,
aonde quer que estejas.
.
Dreaming the breasts
Mother,
strange goddess face
above my milk home,
that delicate asylum,
I ate you up.
All my need took
you down like a meal.
What you gave
I remember in a dream:
the freckled arms binding me,
the laugh somewhere over my woolly hat,
the blood fingers tying my shoe,
the breasts hanging like two bats
and then darting at me,
bending me down.
The breasts I knew at midnight
beat like the sea in me now.
Mother, I put bees in my mouth
to keep from eating
yet it did no good.
In the end they cut off your breasts
and milk poured from them
into the surgeon’s hand
and he embraced them.
I took them from him
and planted them.
I have put a padlock
on you, Mother, dear dead human,
so that your great bells,
those dear white ponies,
can go galloping, galloping,
wherever you are.
– Anne Sexton [tradução Jorge Sousa Braga*]. in: Poesia Ilimitada, publicado em 21.8.2011.
§
Menstruação aos quarenta
Pensava num filho.
O ventre não é um relógio
nem um sino que toca,
mas no décimo primeiro mês da sua vida
sinto o Novembro
do corpo assim como o do calendário.
Daqui a dois dias será o meu aniversário
e como sempre a terra terá entregue a sua colheita.
Neste tempo procuro a morte,
a noite para a qual me inclino,
a noite que desejo.
Bem, pois então—
fala dele!
Durante todo este tempo esteve no ventre.
Pensava num filho…
Tu, o nunca conseguido,
o nunca semeado ou desatado,
tu, o dos genitais que eu temia,
o talo e o fôlego do cachorro.
Dar-te-ei os meus olhos ou os dele?
Serás tu o David ou a Susana?
(Ouvi esses dois nomes e elegi-os.)
Podes ser igual aos homens da tua família,
os músculos das pernas de Michelangelo,
mãos originárias da Jugoslávia,
em qualquer parte o camponês, eslavo e determinado,
em qualquer parte o sobrevivente, pletórico de vida—
podia tudo isto ainda ser possível
com os olhos de Susana?
Tudo isto sem ti—
dois dias que se foram em sangue.
Morrerei sem ser baptizada,
a terceira filha que não azucrinaram.
A minha morte virá no dia do santo do meu nome,
O que há de errado com o dia do santo do meu nome?
É só um anjo do sol.
Mulher,
que teces uma teia de aranha sobre ti mesma,
um veneno fino e emaranhado.
Escorpião,
má aranha—
morre.
A minha morte pelos pulsos,
duas etiquetas com o meu nome,
sangue usado como um corpete
para florescer,
uma à esquerda e outra à direita:
é uma habitação quente,
o lugar do sangue.
Deixa a porta aberta sobre as dobradiças!
Dois dias para a tua morte
e dois dias até à minha.
Amor! Essa rubra doença –
Ano após ano, David, deixar-me-ias furiosa!
David, Susana, David, David!
roliço e desgrenhado, assobiando na noite,
sem nunca envelhecer,
esperando sempre por ti no alpendre…
ano após ano,
minha cenoura, meu repolho,
ter-te-ia possuído antes de todas as mulheres,
chamando pelo nome,
chamando-te minha.
.
Menstruation at forty
I was thinking of a son.
The womb is not a clock
nor a bell tolling,
but in the eleventh month of its life
I feel the November
of the body as well as of the calendar.
In two days it will be my birthday
and as always the earth is done with its harvest.
This time I hunt for death,
the night I lean toward,
the night I want.
Well then—
speak of it!
It was in the womb all along.
I was thinking of a son …
You! The never acquired,
the never seeded or unfastened,
you of the genitals I feared,
the stalk and the puppy’s breath.
Will I give you my eyes or his?
Will you be the David or the Susan?
(Those two names I picked and listened for.)
Can you be the man your fathers are—
the leg muscles from Michelangelo,
hands from Yugoslavia
somewhere the peasant, Slavic and determined,
somewhere the survivor bulging with life—
and could it still be possible,
all this with Susan’s eyes?
All this without you—
two days gone in blood.
I myself will die without baptism,
a third daughter they didn’t bother.
My death will come on my name day.
What’s wrong with the name day?
It’s only an angel of the sun.
Woman,
weaving a web over your own,
a thin and tangled poison.
Scorpio,
bad spider—
die!
My death from the wrists,
two name tags,
blood worn like a corsage
to bloom
one on the left and one on the right—
It’s a warm room,
the place of the blood.
Leave the door open on its hinges!
Two days for your death
and two days until mine.
Love! That red disease—
year after year, David, you would make me wild!
David! Susan! David! David!
full and disheveled, hissing into the night,
never growing old,
waiting always for you on the porch …
year after year,
my carrot, my cabbage,
I would have possessed you before all women,
calling your name,
calling you mine.
– Anne Sexton [tradução Jorge Sousa Braga*]. in: Poesia Ilimitada, publicado em 21.8.2011.
§
Uma praga contra elegias
Oh, meu amor, por que discutimos desse jeito?
Estou cansada desse seu papo devoto.
E também estou cansada de todos os mortos.
Eles se recusam a ouvir,
então deixe-os em paz.
Tire seu pé do cemitério,
eles estão ocupados em estar mortos.
A culpa era sempre de todo mundo:
a última garrafa vazia de birita,
os pregos enferrujados e penas de galinha
grudados no barro do degrau da porta dos fundos,
os vermes que viviam debaixo da orelha do gato
e o pastor de lábios finos
que se recusava a dar as caras
exceto uma vez num dia assolado por pulgas
quando ele chegou arrastando os pés pelo jardim
à procura de um bode expiatório.
Me escondi na cozinha, debaixo do saco de panos de chão.
Eu me recuso a lembrar dos mortos.
E os mortos estão enfastiados com tudo isso.
Mas você — vá em frente,
ande, continue,
entre no cemitério,
deite-se onde achar que estão os rostos deles;
retruque com seus velhos pesadelos de sempre.
.
A curse against elegies
Oh, love, why do we argue like this?
I am tired of all your pious talk.
Also, I am tired of all the dead.
They refuse to listen,
so leave them alone.
Take your foot out of the graveyard,
they are busy being dead.
Everyone was always to blame:
the last empty fifth of booze,
the rusty nails and chicken feathers
that stuck in the mud on the back doorstep,
the worms that lived under the cat’s ear
and the thin-lipped preacher
who refused to call
except once on a flea-ridden day
when he came scuffing in through the yard
looking for a scapegoat.
I hid in the kitchen under the ragbag.
I refuse to remember the dead.
And the dead are bored with the whole thing.
But you – you go ahead,
go on, go on back down
into the graveyard,
lie down where you think their faces are;
talk back to your old bad dreams.
– Anne Sexton [tradução Renato Marques de Oliveira**]. em “Anne Sexton e a Poesia Confessional: antologia e tradução comentada”/Renato Marques de Oliveira.- Campinas, SP: [s.n.], 2004.
§
Do jardim
Vem, meu amado.
olha os lírios.
Temos tão pouca fé.
Falamos demais.
Joga fora teu punhado de palavras
e vem comigo observar
os lírios se abrindo em campo tão vasto,
ali crescendo como iates,
guiando devagarinho as pétalas
sem enfermeiras nem relógios.
Olhemos a paisagem:
uma casa cujos salões enlameados
são adornados por nuvens brancas.
Oh, joga fora tuas palavras, as boas
e as ruins. Cospe
tuas palavras como pedras!
Vem cá! Vem cá!
Vem comer minhas frutas deliciosas.
.
From the garden
Come, my beloved,
consider the lilies.
We are of little faith.
We talk too much.
Put your mouthful of words away
and come with me to watch
the lilies open in such a field,
growing there like yachts,
slowly steering their petals
without nurses or clocks.
Let us consider the view:
a house where white clouds
decorate the muddy halls.
Oh, put away your good words
and your bad words. Spit out
your words like stones!
Come here! Come here!
Come eat my pleasant fruits.
– Anne Sexton [tradução Renato Marques de Oliveira**]. em “Anne Sexton e a Poesia Confessional: antologia e tradução comentada”/Renato Marques de Oliveira.- Campinas, SP: [s.n.], 2004.
§
O sol
Ouvi falar de peixes
que vieram à tona pelo sol
e que ali ficaram para sempre,
ombro a ombro,
avenidas de peixes que nunca mais voltaram,
deles sugadas
todas as solidões e manchas vaidosas.
Penso nas moscas
que saem de suas cavernas imundas
arena adentro.
No começo são transparentes.
Então ficam azuis, com asas de cobre.
Brilham nas testas dos homens.
Nem pássaros nem acrobatas,
vão esturricar feito sapatinhos pretos.
Sou uma criatura idêntica.
Adoeço por causa do frio e do cheiro da casa,
dispo-me sob a lente de aumento ardente.
Minha pele se achata feito água do mar.
Oh olho amarelo,
que eu fique doente com teu calor,
que eu fique febril e franzida.
Agora entrego-me totalmente.
Sou tua filha, tua guloseima,
teu padre, tua boca e teu pássaro
e contarei a todos histórias de ti.
Até ser enterrada para sempre,
uma flâmula cinza esgarçada.
(maio de 1962)
.
The sun
I have heard of fish
coming up for the sun
who stayed forever,
shoulder to shoulder,
avenues of fish that never got back,
all their proud spots and solitudes
sucked out of them.
I think of flies
who come from their foul caves
out into the arena.
They are transparent at first.
Then they are blue with copper wings.
Neither bird nor acrobat
they will dry out like small black shoes.
I am an identical being.
Diseased by the cold and the smell of the house
I undress under the burning magnifying glass.
My skin flattens out like sea water.
O yellow eye,
let me be sick with your heat,
let me be feverish and frowning.
Now I am utterly given.
I am your daughter, your sweet-meat,
your priest, your mouth and your bird
and I will tell them all stories of you
until I am laid away forever,
a thin gray banner.
(may 1962)
– Anne Sexton [tradução Renato Marques de Oliveira**]. em “Anne Sexton e a Poesia Confessional: antologia e tradução comentada”/Renato Marques de Oliveira.- Campinas, SP: [s.n.], 2004.
§
Na companhia de anjos
Eu estava farta de ser mulher,
farta das colheres e das panelas,
farta da minha boca e dos meus seios,
farta dos cosméticos e das sedas.
À minha mesa ainda havia homens,
ao redor da tigela que eu ofertava.
A tigela estava repleta de uvas purpúreas,
e as moscas pairavam por causa do aroma
e até meu pai veio com seu osso branco.
Mas eu estava farta do gênero das coisas.
Ontem à noite tive um sonho
e disse-lhe …
“Tu és a resposta,
Tu viverás mais que meu marido e meu pai.”
Nesse sonho havia uma cidade feita de correntes
onde Joana foi dada à morte em roupas de homem
e onde a natureza dos anjos não se explicava,
nenhum da mesma espécie,
um com um nariz, outro com uma orelha na mão,
um mascando uma estrela e gravando sua órbita,
cada qual como um poema que obedecesse a si próprio,
executando as funções de Deus,
um povo à parte.
“Tu és a resposta”,
disse eu, e entrei,
deitando-me nos portões da cidade.
Então fui presa com correntes
e perdi meu gênero comum e meu aspecto final.
Adão estava à minha esquerda
e Eva à minha direita,
ambos de todo inconsistentes com o mundo da razão.
Entrelaçamos os braços
e galopamos sob o sol.
Eu já não era mulher,
nem uma coisa nem outra.
Oh filhas de Jerusalém,
o rei me trouxe para seus aposentos.
Sou negra e sou bela.
Fui aberta e despida.
Não tenho braços nem pernas.
Sou uma só pele, como peixe.
Sou tão mulher
quanto Cristo era homem.
(fevereiro de 1963)
.
Consorting with angels
I was tired of being a woman,
tired of the spoons and the post,
tired of my mouth and my breasts,
tired of the cosmetics and the silks.
There were still men who sat at my table,
circled around the bowl I offered up.
The bowl was filled with purple grapes
and the flies hovered in for the scent
and even my father came with his white bone.
But I was tired of the gender things.
Last night I had a dream
and I said to it…
‘You are the answer.
You will outlive my husband and my father.’
In that dream there was a city made of chains
where Joan was put to death in man’s clothes
and the nature of the angels went unexplained,
no two made in the same species,
one with a nose, one with an ear in its hand,
one chewing a star and recording its orbit,
each one like a poem obeying itself,
performing God’s functions,
a people apart.
‘You are the answer, ‘
I said, and entered,
lying down on the gates of the city.
Then the chains were fastened around me
and I lost my common gender and my final aspect.
Adam was on the left of me
and Eve was on the right of me,
both thoroughly inconsistent with the world of reason.
We wove our arms together
and rode under the sun.
I was not a woman anymore,
not one thing or the other.
O daughters of Jerusalem,
the king has brought me into his chamber.
I am black and I am beautiful.
I’ve been opened and undressed.
I have no arms or legs.
I’m all one skin like a fish.
I’m no more a woman
than Christ was a man.
(february 1963)
– Anne Sexton [tradução Renato Marques de Oliveira**]. em “Anne Sexton e a Poesia Confessional: antologia e tradução comentada”/Renato Marques de Oliveira.- Campinas, SP: [s.n.], 2004.
§
Para o ano dos loucos
uma oração
Ai Maria, mãezinha frágil,
escuta-me, escuta-me agora
ainda que eu não saiba tuas palavras.
O rosário negro com o Cristo prateado
repousa profano em minha mão
pois sou a incrédula.
Cada conta dura e redonda entre meus dedos
é um anjinho negro.
Ai Maria, permite-me essa graça,
essa travessia,
ainda que eu seja feia,
submersa em meu próprio passado
e minha própria loucura.
Embora haja cadeiras,
estou deitada no chão.
Apenas minhas mãos estão vivas,
tocando as contas.
Palavra por palavra, tropeço.
Iniciante ainda, sinto tua boca tocar a minha.
Conto as contas como ondas,
martelando sobre mim.
Perco a conta, desanimo com o número delas,
doente, doente do calor do verão
e a janela acima de mim
é minha única ouvinte, meu ser acanhado.
Ela aceita tudo, me conforta.
Ela é a que dá alento,
e murmura,
bafejando os largos pulmões como um peixe enorme.
Cada vez mais perto,
chega a hora da minha morte
enquanto rearrumo meu rosto, retrocedo,
regrido, meu cabelo fica liso.
Tudo isso é morte.
Na mente há uma viela estreita chamada morte
e passo por ali como se estivesse n’ água.
Meu corpo é inútil.
Jaz imóvel, enrolado como um cachorro no tapete.
Entregou os pontos.
Não há palavras senão as aprendidas pela metade,
o Ave Maria e o cheia de graça.
Agora inicei o ano sem palavras.
Noto a entrada esquisita e a voltagem exata.
Elas existem sem palavras.
Sem palavras pode-se tocar o pão
e receber nas mãos o pão,
sem som algum.
Ai Maria, médica afável,
vem com pós e ervas,
pois estou no centro.
É bem pequeno e o ar é cinzento,
como numa casa de máquinas
Passam-me o vinho como a uma criança dão o leite.
É ofertado num cálice delicado,
bojudo e de bordas finas.
O vinho em si é cor de piche, mosto e secreto.
O cálice ergue-se sozinho rumo à minha boca
e só percebo e entendo tudo isso
porque acontece.
Tenho medo de tossir
mas não falo,
medo de chuva, medo do cavaleiro
que entra galopando em minha boca.
O cálice entorna por si só
e estou em fogo.
Vejo dois filetes que descem queimando meu queixo.
Vejo-me como se fosse outra.
Fui cortada em duas.
Ai Maria, abre tuas pálpebras.
Estou nos dominios do silêncio,
o reino dos loucos e dos sonâmbulos.
Há sangue aqui
e eu o comi.
Ai mãe do ventre,
vim apenas em busca de sangue?
Ai mãezinha,
estou em meu juízo perfeito,
estou trancada na casa errada.
(agosto de 1963)
.
For the year of the insane
a prayer
O Mary, fragile mother,
hear me, hear me now
although I do not know your words.
The black rosary with its silver Christ
lies unblessed in my hand
for I am the unbeliever.
Each bead is round and hard between my fingers,
a small black angel.
O Mary, permit me this grace,
this crossing over,
although I am ugly,
submerged in my own past
and my own madness.
Although there are chairs
I lie on the floor.
Only my hands are alive,
touching beads.
Word for word, I stumble.
A beginner, I feel your mouth touch mine.
I count beads as waves,
hammering in upon me.
I am ill at their numbers,
sick, sick in the summer heat
and the window above me
is my only listener, my awkward being.
She is a large taker, a soother.
The giver of breath
she murmurs,
exhaling her wide lung like an enormous fish.
Closer and closer
comes the hour of my death
as I rearrange my face, grow back,
grow undeveloped and straight-haired.
All this is death.
In the mind there is a thin alley called death
and I move through it as
through water.
My body is useless.
It lies, curled like a dog on the carpet.
It has given up.
There are no words here except the half-learned,
the Hail Mary and the full of grace.
Now I have entered the year without words.
I note the queer entrance and the exact voltage.
Without words they exist.
Without words on my touch bread
and be handed bread
and make no sound.
O Mary, tender physician,
come with powders and herbs
for I am in the center.
It is very small and the air is gray
as in a steam house.
I am handed wine as a child is handed milk.
It is presented in a delicate glass
with a round bowl and a thin lip.
The wine itself is pitch-colored, musty and secret.
The glass rises in its own toward my mouth
and I notice this and understand this
only because it has happened.
I have this fear of coughing
but I do not speak,
a fear of rain, a fear of the horseman
who comes riding into my mouth.
The glass tilts in on its own
and I amon fire.
I see two thin streaks burn down my chin.
I see myself as one would see another.
I have been cut int two.
O Mary, open your eyelids.
I am in the domain of silence,
the kingdom of the crazy and the sleeper.
There is blood here.
and I haven’t eaten it.
O mother of the womb,
did I come for blood alone?
O little mother,
I am in my own mind.
I am locked in the wrong house.
(august 1963)
– Anne Sexton [tradução Renato Marques de Oliveira**]. em “Anne Sexton e a Poesia Confessional: antologia e tradução comentada”/Renato Marques de Oliveira.- Campinas, SP: [s.n.], 2004.
§
A noite estrelada
Isso não me livra de sentir uma terrível necessidade
de –devo dizer a palavra — religião. Então eu saio
à noite para pintar as estrelas.
– VINCENT V AN GOGH, em: carta a seu irmão
A cidade não existe
a não ser onde uma árvore de cabelos negros
se esgueira, como uma mulher afogada, rumo ao céu ardente.
A cidade silencia. A noite ferve em onze estrelas.
Oh noite noite estrelada! É assim
que quero morrer.
A noite se move. Estão todas vivas.
Até mesmo a lua, inchada em grilhões alaranjados
para, como um deus, expelir crianças de seu olho.
A velha serpente invisível devora as estrelas.
Oh noite noite estrelada! É assim
que quero morrer:
dentro da fera furiosa da noite,
engolida pelo grande dragão, cuspida
da vida sem bandeira,
sem ventre,
sem grito.
.
The starry night
That does not keep me from having a terrible need of
– shall I say the word – religion.
Then I go out at night to paint the stars.
– VINCENT V AN GOGH, in: a letter to his brother
The town does not exist
except where one black-haired tree slips
up like a drowned woman into the hot sky.
The town is silent. The night boils with eleven stars.
Oh starry night! This is how
I want to die.
It moves. They are all alive.
Even the moon bulges in its orange irons
to push children, like a god, from its eye.
The old unseen serpent swallows up the stars.
Oh starry starry night! This is how
I want to die:
into that rushing beast of the night,
sucked up by that great dragon, to split
from my life with no flag,
no belly,
no cry.
– Anne Sexton [tradução Renato Marques de Oliveira**]. em “Anne Sexton e a Poesia Confessional: antologia e tradução comentada”/Renato Marques de Oliveira.- Campinas, SP: [s.n.], 2004.
§
Eu me lembro
No comecinho de agosto
os besouros invisíveis começaram
a roncar e a grama ficou
rija feito cânhamo e sem
cor — se é que
a areia tem uma cor e
nossos pés descalços já estavam
descalços desde vinte
de junho e muitas vezes
esquecíamos de dar corda no
seu despertador e algumas noites
tomávamos quente e puro o nosso gim
em copos velhos de geléia enquanto
o sol sumia da vista
feito um chapéu vermelho num desenho e
um dia amarrei meu cabelo para trás
com um laço e vocé disse que
eu estava quase parecendo
uma mocinha puritana e do que
me lembro melhor é que
a porta do seu quarto era
a porta do meu.
.
I remember
By the first of August
the invisible beetles began
to snore and the grass was
as tough as hemp and was
no color—no more than
the sand was a color and
we had worn our bare feet
bare since the twentieth
of June and there were times
we forgot to wind up your
alarm clock and some nights
we took our gin warm and neat
from old jelly glasses while
the sun blew out of sight
like a red picture hat and
one day I tied my hair back
with a ribbon and you said
that I looked almost like
a puritan lady and what
I remember best is that
the door to your room was
the door to mine.
– Anne Sexton [tradução Renato Marques de Oliveira**]. em “Anne Sexton e a Poesia Confessional: antologia e tradução comentada”/Renato Marques de Oliveira.- Campinas, SP: [s.n.], 2004.
§
Canção da lua, canção da mulher
À noite estou viva.
De manhã estou morta,
lamparina que já usou todo o óleo,
ossos soturnos e pálidos.
Sem milagre. Sem deslumbre.
Estou em péssimo estado
mas você está alto em seu traje de guerra
e devo preparar sua jornada.
Fui sempre a virgem,
velha e bexiguenta.
Antes do mundo existir, eu já existia.
Tenho ficado alaranjada e gorda,
cor de cenoura, de embasbacar,
deixo meus ohs rachados pingarem no mar
perto de Veneza e Mombaça.
Descansei sobre o Maine.
Caí como um jato dentro do Pacífico.
Cometi perjúrio acima do Japão.
Balançei meu pêndulo,
minha sacola gorda, minha luz
dourada, dourada,
pisca-pisca
sobre todos vocês.
Então, se você tem que indagar, que o faça.
Afinal de contas, não sou artificial.
Há muito tenho observado você,
vazia e com o ventre repleto de amor,
oscilando minha tela infinita
para você, você meu homem gélido, gélido
de macacão.
Você só precisa pedir
e eu faço.
É praticamente certo
que você irá entrar em mim como numa caserna.
Então venha cruzando, venha cruzando,
você da explosão,
você da fortaleza,
você do ardil,
fecharei meu olho saltado,
o quartel-general de uma área,
a casa de um sonho.
.
Moon song, woman song
I am alive at night.
I am dead in the morning,
an old vessel who used up her oil,
bleak and pale boned.
No miracle. No dazzle.
I’m out of repair
but you are tall in your battle dress
and I must arrange for your journey.
I was always a virgin,
old and pitted.
Before the world was, I was.
I have been oranging and fat,
carrot colored, gaped at,
allowed my cracked o’s to drop on the sea
near Venice and Mombasa.
Over Maine I have rested.
I have fallen like a jet into the Pacific.
I have committed perjury over Japan.
I have dangled my pendulum,
my fat bag, gold, gold,
blinkedly light
over you all.
So if you must inquire, do so.
After all I am not artificial.
I looked long upon you,
love-bellied and empty,
flipping my endless display
for you, you my cold, cold
coverall man.
You need only request
and I will grant it.
It is virtually guaranteed
that you will walk into me like a barracks.
So come cruising, come cruising,
you of the blast off,
you of the bastion,
you of the scheme.
I will shut my fat eye down,
headquarters of an area,
house of a dream.
– Anne Sexton [tradução Renato Marques de Oliveira**]. em “Anne Sexton e a Poesia Confessional: antologia e tradução comentada”/Renato Marques de Oliveira.- Campinas, SP: [s.n.], 2004.
§
A viciada
Mascate do sono,
Mascate da morte,
toda noite com cápsulas na palma das mãos,
oito de cada vez, de belos vidros de farmácia,
preparo uma jornada em miniatura.
Sou a rainha desse tipo de coisa.
Sou expert em fazer a viagem.
E agora dizem que sou uma viciada.
Agora me perguntam o porquê.
O porquê!
Não sabem
que prometi morrer!
Estou treinando.
Estou só ficando em forma.
Os comprimidos são uma mãe, só que melhores,
de todas as cores e tão bons quanto bala azedinha.
Estou num regime da morte.
Sim, admito
que um pouco virou rotina —
oito pancadas de uma vez, o olho esmurrado,
arrastada por boas-noites cor-de-rosa, alaranjados,
verdes e brancos.
Estou me tornando quase que uma mistura
química.
É isso aí!
Meu estoque
de pastilhas
tem que durar muitos anos.
Teimosas que é um inferno, não vão me largar.
É um tipo de casamento.
É um tipo de guerra
em que vou plantando bombas dentro
de mim.
Sim,
tento
me matar aos pouquinhos,
uma ocupação inócua.
Na verdade estou obcecada.
Mas lembre-se de que quase não faço barulho.
E para ser franca ninguém precisa ficar me arrastando
e também não fico lá vestindo minha mortalha.
Sou uma florzinha em minha camisola amarela
comendo meus oito pães, um de cada vez
e numa certa ordem, como na
imposição das mãos
durante um sacramento negro.
É uma cerimônia
mas como qualquer outro esporte
é repleta de regras.
É como um jogo de tênis musical
em que minha boca fica pegando a bola.
Daí me deito no meu altar
elevada pelos oito beijos químicos.
E que repouso que é
com dois boas-noites cor-de-rosa, dois alaranjados,
dois verdes, dois brancos.
Fee-fi-fo-fum —
Agora estou tomada.
Agora estou entorpecida.
(1 de fevereiro de 1966)
.
The addict
Sleepmonger,
deathmonger,
with capsules in my palms each night,
eight at a time from sweet pharmaceutical bottles
I make arrangements for a pint-sized journey.
I’m the queen of this condition.
I’m an expert on making the trip
and now they say I’m an addict.
Now they ask why.
WHY!
Don’t they know that I promised to die!
I’m keping in practice.
I’m merely staying in shape.
The pills are a mother, but better,
every color and as good as sour balls.
I’m on a diet from death.
Yes, I admit
it has gotten to be a bit of a habit-
blows eight at a time, socked in the eye,
hauled away by the pink, the orange,
the green and the white goodnights.
I’m becoming something of a chemical
mixture.
that’s it!
My supply
of tablets
has got to last for years and years.
I like them more than I like me.
It’s a kind of marriage.
It’s a kind of war where I plant bombs inside
of myself.
Yes
I try
to kill myself in small amounts,
an innocuous occupatin.
Actually I’m hung up on it.
But remember I don’t make too much noise.
And frankly no one has to lug me out
and I don’t stand there in my winding sheet.
I’m a little buttercup in my yellow nightie
eating my eight loaves in a row
and in a certain order as in
the laying on of hands
or the black sacrament.
It’s a ceremony
but like any other sport
it’s full of rules.
It’s like a musical tennis match where
my mouth keeps catching the ball.
Then I lie on; my altar
elevated by the eight chemical kisses.
What a lay me down this is
with two pink, two orange,
two green, two white goodnights.
Fee-fi-fo-fum-
Now I’m borrowed.
Now I’m numb.
(first of February 1966)
– Anne Sexton [tradução Renato Marques de Oliveira**]. em “Anne Sexton e a Poesia Confessional: antologia e tradução comentada”/Renato Marques de Oliveira.- Campinas, SP: [s.n.], 2004.
§
O beijo
Minha boca viceja como um corte.
Fui enganada o ano todo, noites
de tédio, nada além de cotovelos ásperos
e caixinhas delicadas de Kleenex gritando chorona,
chorona, bobona!
Até hoje meu corpo era inútil.
Agora seus cantos querem se rasgar.
Ele rasga os vestidos velhos da Maria, nó por nó
e veja só — Agora está carregado de raios elétricos.
Zing! Uma ressurreição!
Outrora era um barco, bem rígido
e encalhado, desconhecia água salgada
e precisava de pintura. Não passava
de um monte de tábuas. Mas você a içou, a equipou.
Ela foi eleita.
Meus nervos estão excitados. Eu os ouço como
instrumentos musicais. Onde havia silêncio
os tambores, as cordas, tocam irremediavelmente. Você fez isso.
Puro gênio em ação. Querido, o compositor
pisou no fogo.
.
The kiss
My mouth blooms like a cut.
I’ve been wronged all year, tedious
nights, nothing but rough elbows in them
and delicate boxes of Kleenex calling crybaby
crybaby, you fool!
Before today my body was useless.
Now it’s tearing at its square comers.
It’s tearing old Mary’s garments offi knot by knot
and see — Now it’s shot full of these electric bolts.
Zing! A resurrection!
Once it was a boat, quite wooden
and with no business, no salt water under it
and in need of some paint. It was no more
than a group ofboards. But you hoisted her, rigged her.
She’ s been elected.
My nerves are tumed on. I hear them like
musical ínstruments. Where there was silence
the drums, the strings are incurably playing. You did this.
Pure genius at work. Darling, the composer has stepped
in to fire.
– Anne Sexton [tradução Renato Marques de Oliveira**]. em “Anne Sexton e a Poesia Confessional: antologia e tradução comentada”/Renato Marques de Oliveira.- Campinas, SP: [s.n.], 2004.
§
Só uma vez
Só uma vez eu soube para que servia a vida.
Em Boston, bem de repente, entendi;
estava andando ao longo do rio Charles,
assistindo as luzes se copiando,
todas de néon, corações estrobocópicos,
as bocas tão abertas quanto as das cantoras de ópera;
eu contava as estrelas, minhas pequenas partidárias,
minhas margaridas de cicatriz, e sabia que levava meu amor
no verde lado noturno e clamava meu coração
para os carros rumo a leste e clamava meu coração
para os carros rumo a oeste e peguei
minha verdade e atravessei uma pontezinha corcunda
e corri depressa com minha verdade, o encanto dela, para casa
e amontoei essas constantes manhã adentro
só para perdê-las todas.
.
Just once
Just once I knew what life was for.
In Boston, quite suddenly, I understood;
walked there along the Charles River,
watched the lights copying themselves,
ali neoned and strobe-hearted, opening
their mouths as wide as opera singers;
counted the stars, my little campaigners,
my scar daisies, and knew that I walked my love
on the night green side of it and cried
my heart to the eastbound cars and cried
my heart to the westbound cars and took
my truth across a small humped bridge
and hurried my truth, the charm of it, home
and hoarded these constants into moming
only to find them gane.
– Anne Sexton [tradução Renato Marques de Oliveira**]. em “Anne Sexton e a Poesia Confessional: antologia e tradução comentada”/Renato Marques de Oliveira.- Campinas, SP: [s.n.], 2004.
***
BREVE BIOGRAFIA DE ANNE SEXTON
Anne Gray Harvey (poeta e ensaísta norte-americana) nasceu em 9 de novembro de 1928, em Massachusetss, EUA. Poeta conhecida por sua poesia de estilo confessional muito pessoal, sua temática inclui uma longa batalha contra a depressão, suas tendências suicidas e vários detalhes íntimos de sua vida privada. Ao longo da vida, sofreu diversos transtornos mentais. O primeiro episódio maníaco ocorreu em 1954. Depois de um segundo colapso em 1955, conheceu o médico Martin Theodore Orne, que se tornou seu terapeuta de longa data e quem a encorajou a escrever poesia, devido a sua transbordante imaginação e sensibilidade poética. Apesar de nunca ter frequentado faculdade, ensinou redação criativa na Universidade de Boston entre 1970 e 1974. Sua única instrução formal consistiu em aulas de educação de adultos em algumas faculdades de Boston. No entanto a poesia que escreveu como jovem-dona-de-casa atraiu a atenção imediata do público, através da veiculação em jornais e revistas literárias. À publicação de seus três primeiros livros, seguiu-se uma torrente de subvenções e prêmios. Sua primeira coletânea To bedlam and part way back (1960), foi indicada para o National Book Award. O seguinte, All my pretty ones (1962), deu-lhe um prêmio de viagem, outorgado pela “Revista do Congresso para Liberdade Cultural”. Em 1965, a coletânea Selected poems, foi publicada na Inglaterra, onde foi eleita para a Royal Society of Literature. Com o quarto livro, Live or die ( 1966), arrebatou o Prêmio Pullitzer e o Shelley Memorial Prize da Poetry Society of America. Antes, porém, estudou literatura e participou de um curso de escrita criativa, ministrado por John Holmes. Mais tarde, foi aluna de Robert Lowell na Universidade de Boston, juntamente com outros poetas distintos com Sylvia Plath e Goerge Starbuck. Sua atuação como poeta, no entanto, foi encorajado por W.D. Snodgrass, que se tornou seu mentor e amigo. Um dos poemas dele – Heart’s needle – serviu-lhe como inspiração para um de seus livros: The double image, onde aborda o relacionamento generacional entre mãe e filha. Sua poesia reflete os tormentos de sua vida entre os deveres domésticos, sua vocação poética, dependência de drogas e alcoolismo crônico. Tais problemas se refletiam no relacionamento conjugal, culminando com o divórcio em 1973. Tal fato veio desestabilizar mais ainda seu estado emocional. Livros publicados, além dos citados: Love poems (1969), Mercy street (1969), Transformations (1971), The book of Folly (1972), The death notebooks (1974) seu último livro. Sua existência literária se prolongou por mais tempo através dos livros póstumos: The Awful rowing toward god (1975), 45 Mercy Street (1976), Anne Sexton: A self portrait in letters (1977), Words for Dr. Y. (1978), No evil star: selected essays, interviews and prose (1985). Em 4 de outubro de 1974, fechada em sua garagem, ligou o carro e cometeu suicídio inalando monóxido de carbono.
:: Fonte: Tiro de Letra (12.6.2016).
De Anne Sexton (inglês)
:: The complete poems. Anne Sexton. Boston: Houghton Mifflin Company, 1982.
:: Anne Sexton: A self-portrait in letters. [editors Linda Gray Sexton e Lois Ames]. Boston: Houghton Mifflin Company, 1979.
:: Anne Sexton. No Evil Star. Selected Essays, Interviews and Prose. [editor E. Steven Colburn]. Ann Arbor: The University of Michigan Press, 1985 (Poets on Poetry).
OBRA DE ANNE SEXTON EM PORTUGUÊS***
Antologia (participação)
:: Antologia da nova poesia norte-americana. [seleção, tradução e notas de Jorge Wanderley]. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1992.
:: Do jeito delas, vozes femininas de língua inglesa. [tradução Jorge Wanderley; organização Márcia Cavendish Wanderley, Carlos Eduardo Fialho e Sueli Cavendish]. Rio de Janeiro: 7Letras, 2008.
*** são raras e esparsas as traduções em língua portuguesa da obra de Anne Sexton, apenas encontrado em antologias, trabalhos acadêmicos, sites e blogs.
Bibliografia sobre anne sexton
D’ANGELO, Biagio. Trobar nou. Esperienze poetiche in alcune voci di donne del ?900 (Hilda Hilst, Anne Sexton, Marina Cvetaeva). Rassegna iberistica, v. 93, p. 3-18, 2011.
GARCIA, Marília. 20 poemas para o seu walkman. Coleção ás de colete, São Paulo, Rio de Janeiro: Cosac Naify Edições, 7letras, 2006.
LEONARDI, Amanda. Hora do poema: Anne Sexton e a poesia confessional. in: Leteratortura, 24.3.2016. Disponível no link. (acessado em 12.6.2016).LIMA, Ana Cecilia Acioli. The shattering of myth: Anne Sexton’s transforming view of fairy tales. (Dissertação Mestrado em Letras). Universidade Federal de Santa Catarina, UFSC, 1992.
LIMA, Ana Cecilia Acioli. Anne Sexton e Suas Transformações: A importância da Critica Feminista e A Poesia Revisionista. In: VI SEMINARIO NACIONAL MULHER E LITERATURA, 1995, Rio de Janeiro. Anais do VI Seminário Nacional Mulher e Literatura. Rio de Janeiro: UFRJ, 1995. p. 361-370.
** OLIVEIRA, Renato Marques de.. Anne Sexton e a Poesia Confessional: antologia e tradução comentada I Renato Marques de Oliveira. (Dissertação mestrado em Teoria e História Literária). Universidade Estadual de Campinas, UNICAMP, 2004. Disponível no link. (acessado em 13.5.2016).
OLIVEIRA, Renato Marques de (tradução).. “The Black Art” e “The Moss of His Skin”, poemas de Anne Sexton. Campinas: Versal Casa de Livros, 1997.
MIDDLEBROOK, Diane Wood. Anne Sexton – A morte não é a vida. (biografia e alguns poemas).. [tradução Raul de Sá Barbosa]. São Paulo: Editora Siciliano, 1994.
PERIN, Bernardo Antônio Beledeli. Anne Sexton: poesia, tradução, transformações. (Monografia de Graduação em Letras). Universidade Federal do Paraná, UFPR, 2014. Disponível no link. (acessado em 12.6.2016).
SOUSA, Isabela Christina do Nascimento. Representações femininas na poesia de Anne Sexton. (Monografia de Graduação em Letras). Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, UERN, 2011.
Outros cantos: poesia de anne sexton
:: Poesia Ilimitada
:: Anne Sexton – Germina Literatura
:: Anne Sexton (1928 – 1974) | escamandro
:: Anne Sexton – Poetry Foundation
Sobre o tradutor português
* Jorge Sousa Braga (poeta, tradutor e médico português)
Licenciado em Medicina, nasceu em Vila Verde, Braga em 1957. A sua obra poética tem vindo a revelar-se de uma criatividade notável, sendo notório desde o primeiro livro De Manhã Vamos Todos Acordar Com Uma Pérola No Cu, de 1981, uma abordagem da temática dos Descobrimentos e da portugalidade sempre tomada pelo lado irónico e surrealista, com ressonâncias do movimento Beat, de São Francisco. A sensualidade – e a sexualidade, – em poemas íntimos e por vezes extremos bem como a sua paixão pela poesia oriental têm-no levado a escrever haikus em língua portuguesa com assinalável perfeição. Incansável leitor de poesia verteu para português poemas de Jorge Luis Borges, Matsuo Bashô, Li Po, Guillaume Appolinaire, entre muitos outros.
Obra poética: O Poeta Nu (1991), 2ª edição, Fenda Edições, Lisboa, 1999; Fogo Sobre Fogo, Fenda Edições, Lisboa, 1998; Herbário, Assírio & Alvim, Lisboa, 1999; A Ferida Aberta, Assírio & Alvim, Lisboa, 2001; Pó de Estrelas, Assírio & Alvim, Lisboa, 2004; Porto de Abrigo, Assírio & Alvim, Lisboa, 2005.
© Direitos reservados aos herdeiros
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