Eu venho negado tentar eclodir uma razão de vir até aqui. Evito por infantilidade, por angústia. Lembro das luzes que encontrava ao rabiscar esboços de palavras e lembro de dizer a mim mesma que alguém iria lê-las, não por simples prazer literário, mas por uma possível persuasão a minhas reflexões vitalícias.
A evasão encontra-se nas gavetas. Debaixo dos blocos, ao lado dos lápis, rodeada pelas borrachas – embora não seja possível apagá-la. É uma criação infértil. Uma ilusão que como o íntimo, existe para provocar distúrbios de psiques em coma, que seguem incitando a constante necessidade de solucionar a obrigação de ser. É íntimo, pois é indecifrável, é líquido.
Criticam as manifestações sensíveis em época de crise social. Apresentar projetos ideológicos e apontar culpados corruptos são as letras opcionais no simulado da incerteza política. Contudo, não serei escrava do caos. Falo de alma, pois grito por algum ser humano tolhido.
Alguém, apesar de tantos, apesar de outros, que sem erudição e linguagem arcaica, implora existir. Nossa tristeza tampada, é a universalização do fim comum, é a destruição da histeria reprimida, é o momento solene de todos que desistiram.
Seria egoísmo se calar, é insuficiente escrever. No entanto, as letras não abrigam apatia. Não precisam ser interpretadas, compreendidas, disseminadas, proliferadas, publicadas, comercializadas, gabadas ou invejadas. Elas precisam existir. O resto, o todo resto, é nada mais do que consequência de seu belo perigo.
A vida já é dura demais para decidir banalizar os vômitos do essencial humano. A dor já é certa demais para gambiar a turbulência, a instabilidade já está atuando. O íntimo permanecerá sendo motivo, e a evasão continuará arquivada na mesma gaveta, porque uma vez escondida, não permite transgressão.
É tudo ou nada, os abismos estão superlotados. Esqueceram de falar sobre alma, esqueceram de falar sobre pessoas. Manifestos vazios, corpos sem identidade e, enfim, não procuro mais permissão: escrevo novamente pelo nada, existo novamente por tudo aquilo que, de efêmero, traz bandeiras para que a catástrofe não seja mais sinônimo de viver.
*Yasmim Abrahão Raposo, graduanda de Letras-francês na Universidade Federal Fluminense.