Ensinar seu filho a se conectar com o mundo interior pode ser mais fácil do que você imagina
– por Maria Clara Vieira
Uma pequena pausa na rotina. Talvez seja apenas isso que seu filho precisa para ter mais tranquilidade e qualidade de vida. Em um mundo tão agitado, conectado e repleto de estímulos por todos os lados, apreciar um momento de paz e silencio parece impensável para algumas pessoas – embora seja muito necessário e bem-vindo.
A meditação, prática milenar surgida na Ásia, consiste justamente nisso: de maneira simplificada, o objetivo é repousar o corpo e aquietar a mente para alcançar o relaxamento. Parece ótimo, não é? A boa notícia é que as crianças podem se beneficiar desse momento tanto quanto os adultos.
“Nós, adultos, estamos acostumados a dizer que crianças não têm preocupações, responsabilidades nem obrigações, e que a vida delas é perfeita”, afirma a professora de ioga Cássia Parmeggiani, fundadora do projeto Pequenos Yogis. “No entanto, se pararmos para refletir, isto não é verdade. Questões como o bullying, os problemas familiares, o estresse causado pelo excesso de atividades, o uso excessivo de eletrônicos e a cobrança por resultados na escola estão criando crianças tristes e ansiosas, com problemas de atenção, concentração, foco e comportamento”, explica ela.
Os benefícios
Quando incorporada à rotina e praticada de maneira regular, a meditação traz uma porção de benefícios à criança. A lista de pontos positivos é enorme: combate o estresse, alivia a ansiedade, melhorar o sono, reduz a agressividade, relaxa física e mentalmente, melhora a concentração, minimiza os sintomas de TDAH e ajuda a lidar com sentimentos como frustração, medo e raiva.
“Muitos são os benefícios, mas um dos maiores é ajudar as crianças a entrar em contato com elas mesmas. Isso pode ser a chave para uma mudança importante na forma de criarmos nossos filhos, pensando, acima de tudo, no bem estar deles e não somente em resultados”, comenta Cássia.
Como a criança de hoje tem muitos estímulos – aulas extras, telas, brinquedos eletrônicos e tecnologia –, sobra menos tempo para brincar livremente. “Isso é extremamente prejudicial. O excesso de estímulos faz com que ela se desconecte de si mesma e entre em um padrão muito acelerado, com competição e ansiedade”, pondera o professor de ioga João Carlos Soares, criador da Yoga com Histórias.
Soares explica que, quando isso acontece, forma-se na criança um padrão de solidão e desconexão de sua essência. “A meditação vem justamente tentar dar um espaço para que ela possa parar, respirar e se conectar com o silêncio interior. Ela percebe que isso é muito bom e começa a entender que existe um mundo de emoções e pensamentos dentro dela”, diz. Assim, seu filho conseguirá sentir e organizar esse mundo mental e emocional de outra forma, reestabelecendo o equilíbrio e a conexão com quem ele realmente é.
Como fazer
Está animado para colocar a meditação na vida de seu filho? Pode ser mais fácil do que você imagina. Por volta dos 2 ou 3 nos já é possível guiá-lo por esse caminho com atitudes bem simples. É claro que é preciso bom-senso: não espere que uma criança pequena vá ficar 10 minutos paradinha, em silêncio. É preciso respeitar a maturidade emocional dela e não forçar uma situação. Uma boa medida para os pais é verificar se o filho já consegue acompanhar uma história com concentração – elas podem ser usadas para introduzir a meditação de forma lúdica na infância.
“A apenas fechar os olhos, respirar e inspirar não é atrativo para a criança. Mas criando um ambiente mágico e lúdico, ela começa a acompanhar, sente que aquilo é gostoso e se interessa cada vez mais. As histórias conversam com as emoções e os sentimentos da criança”, ensina Soares, que segue um método pensado especificamente para a infância e irá lançar um CD para ajudar a guiar a meditação (confira um exemplo ao final dessa matéria).
Aos poucos
Se você e o seu filho estão familiarizados com a prática, há formas fáceis de começar a introduzi-la de maneira muito natural, por meio de brincadeiras que levam à meditação.
É importante ressaltar o exercício que não deve ser uma imposição, e sim um momento prazeroso e confortável. “À medida em que a criança se familiariza e aprende a manter o foco, podemos aumentar o tempo e incorporar outras técnicas. As práticas que menciono são simples e podem ser realizadas diariamente, como uma pausa na rotina, mesmo que somente por alguns minutos”, esclarece Cássia.
E ela dá exemplos: um passeio no parque para contemplar a natureza, brincar com uma ampulheta e observar a areia caindo, colorir mandalas, escutar uma história e tentar imaginar que é parte dela fazendo uma visualização, colocar o bichinho de pelúcia favorito sobre o peito e observar como ele se movimenta enquanto respiramos… Tudo isso vale!
Na escola
A meditação é tão benéfica que algumas escolas têm apostado nela para acalmar os alunos e melhorar a qualidade de vida deles. É o caso do Colégio Marista Santa Maria (PR), onde há 5 anos os pequenos estudantes contam com professores conscientes sobre a prática. “Há alguns anos, a gente tinha uma especificidade em uma turma atípica, muito ativa e com falta de concentração. Então começamos a pensar em maneiras de ajudar e surgiu a ideia da meditação em sala de aula”, lembra Ana Paula Detzel, coordenadora da Educação Infantil.
“Trouxemos a técnica de respiração e respiração. São exercícios simples de fechar os olhos, se concentrar e ficar com o corpo parado. Começamos com um minuto, no máximo, e, no final do ano, as crianças ficariam até uns 20 minutos se deixássemos”, comenta Ana Paula. A meditação se incorporou à grade horária escolar e virou rotina para professores e alunos a partir de 2 anos. O resultado? Maior concentração e controle emocional. “Tivemos avanços muito significativos”, comemora a coordenadora. “As crianças gostam. É um hábito super natural que se leva por toda a vida”.
Exemplo de meditação guiada para crianças
Em casa, os próprios pais podem propor o momento de relaxamento e meditação. Basta orientar que a criança se sente confortavelmente e ouça suas palavras. A seguir, confira um exemplo de meditação para crianças, fornecido pelo professor João Carlos Soares, do Yoga com Histórias. Narre à criança, de forma calma e pausada:
Feche seus olhos e me acompanhe nessa jornada! Sinta seu corpo confortável, suas costas esticadas e seu rosto completamente relaxado. Respire bem devagar como se seu corpo fosse um imenso balão a se encher. Solte o ar devagar como se o seu corpo fosse um imenso balão a se esvaziar.
Encha o balão. Esvazie o balão.
Encha o balão. Esvazie o balão
Agora, sua mente está tranquila e pronta para passear pelo mundo da imaginação. Gostaria de lhe apresentar um amigo muito especial! Um antigo mago, que viajou por toda a Índia e aprendeu muitas coisas interessantes. Com suas barbas compridas e bochechas rosadas, sempre foi respeitado por todos, em todos os lugares do mundo, pois seus poderes mágicos, sua sabedoria e sua bondade já ajudaram muitas e muitas pessoas.
Ele traz com ele uma pedra, coloca em suas mãos e pede para que você a segure. Sinta a pedra com suas mãos. Toque, explore. Sinta sua forma. Sinta sua textura. Sinta sua temperatura. Perceba se ela é lisa, quente ou fria, grande ou pequena. O mago pede que você segure a pedra com as duas mãos e sinta tudo que você consegue perceber. Esta pedra foi criada pela Mãe Terra há muito, muito tempo atrás e traz dentro dela a força de todo este tempo: uma grande e poderosa energia!
Perceba que, ativada pelo toque de suas mãos, pelo seu poder pessoal, toda esta força se ativa, torna-se novamente viva. Sinta como a pedra brilha intensamente. Perceba que ela se transforma em um lindo cristal. O cristal tem o poder de enviar energia para todo o seu corpo! Sinta seu corpo forte e vivo! Sinta seus pensamentos tranquilos e inteligentes. Sinta a força viva dentro de você.
Perceba que a energia de todas as coisas da vida também está presente dentro de você. E sentindo toda esta magia dentro de você, permaneça em silêncio [pausa de alguns minutos].
Agora, perceba novamente sua respiração, seu corpo e vá retornando lentamente. Namastê. Tudo de bom para você. Tudo de bom para mim. Tudo de bom para todos nós.
Originalmente publicado na “Revista Crescer”.
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