Espetáculo Dois Perdidos numa Noite Suja – Delivery atualiza clássico de Plínio Marcos com entregadores e universitários periféricos; interracialidade e falsa mobilidade social é tema da montagem. Com direção de José Fernando Peixoto de Azevedo e idealização de Michel Pereira, peça faz temporada no Teatro Aliança Francesa
.
Escrita em 1966, a peça Dois Perdidos numa Noite Suja, de Plínio Marcos, aborda a precariedade no mundo do trabalho e as práticas de destituição da vida. Em montagem dirigida por José Fernando Peixoto de Azevedo, essa temática é atualizada a partir de uma perspectiva interracial. O espetáculo estreia no Teatro Aliança Francesa em uma temporada que vai de 23 de setembro a 26 de novembro de 2023, com sessões aos sábados, às 20h30 e, aos domingos, às 18h30. Os ingressos custam R$60 (inteira) e R$ 30 (meia).
Com Michel Pereira e Lucas Rosário, Dois Perdidos numa Noite Suja – Delivery mantém o texto de Plínio Marcos na íntegra. Entretanto, os personagens que eram carregadores de caminhão no original se transformaram em entregadores delivery nesta nova proposta.
.
Além disso, na história dirigida por José Fernando, Tonho é um jovem negro e Paco um jovem branco. Ambos são da periferia e vivem em uma residência estudantil, pois estão lutando para se manter na universidade. “Queríamos atualizar a peça sem alterar o texto. Foi quando o Michel teve a ideia de transformá-los em entregadores. Essa precarização total da vida acaba se revelando um desdobramento daquilo que já aparece no texto de Plínio”, comenta o encenador.
A mistura desses dois universos, verificável hoje na vida universitária, pós-cotas, em que permanência e acolhimento são demandas que emergem num contexto ainda inóspito, dão a ver o tom e a fisionomia de um país em que as promessas de mobilidade social revelam o seu fundo falso no cotidiano.
.
“Durante a pandemia, ficávamos reclusos nas nossas casas enquanto os entregadores trabalhavam pesado. Muitas matérias foram escritas com essa temática e resolvemos explorar isso na montagem. Há diversas referências, como o livro “Uberização, trabalho digital e Indústria 4.0″ (2020), do sociólogo Ricardo Antunes”, conta Michel.
Sobre a encenação
Toda a ação acontece dentro de um quarto, que é o espaço habitado pelos protagonistas. No cenário está presente uma cama, que se converte em um objeto de disputa muito importante.
.
Ao mesmo tempo, existe a presença da câmera como um instrumento complementar à narrativa. Desta vez, o trânsito entre imagens captadas ao vivo e gravadas, desdobram outros aspectos da linguagem cinematográfica em jogo – marca registrada de Azevedo.
.
O espetáculo é permeado por uma forte sensação de claustrofobia. Tonho e Paco vivem de maneira miserável e lutam diariamente pela sobrevivência. A convivência deles naquele ambiente minúsculo ganha contornos violentos, potencializados por questões relativas ao convívio interracial.
.
“Pode-se dizer que Dois Perdidos numa Noite Suja – Delivery é uma continuidade ao trabalho que desenvolvi em Ensaio sobre o Terror. Isso porque as duas peças discutem a dessolidarização entre brancos pobres e negros pobres. E quando colocamos esses dois jovens periféricos morando juntos, em uma situação de igualdade, o que deveria se tornar uma aliança, transforma-se em ressentimento e disputa”, detalha o diretor.
.
A peça de Plínio Marcos foi escrita com inspiração no conto “O Terror de Roma”, de Alberto Moravia. “A filiação aponta já para um duplo movimento: um realismo, em chave crítica, depurado em linguagem, de um lado, e a intuição sobre a violência como uma instância de terror, de outro”. Esses elementos também dialogam com a pesquisa desenvolvida por Azevedo.
Sinopse
Tonho, um jovem negro, e Paco, um jovem branco, são da periferia e dividem uma residência estudantil. Eles têm um cotidiano ambivalente, entre a chegada na universidade e a dificuldade de permanência. Os dois ganham a vida como entregadores delivery. A mistura insuspeitada desses dois universos, verificável já hoje na vida universitária pós-cotas, dá o tom e a fisionomia de um país no qual as promessas de mobilidade social revelam o seu fundo falso no cotidiano supressivo.
MAIS SOBRE
Diretor – José Fernando Peixoto de Azevedo (São Paulo, SP, 1974). Doutor em filosofia pela USP, é pesquisador, dramaturgo e diretor de teatro e filmes, além de professor da Escola de Arte Dramática (EAD) e do Programa de pós-graduação em artes cênicas, ambos da Escola de Comunicações e Artes da USP, onde também colaborou no Curso Superior do Audiovisual do departamento de Cinema, Rádio e Televisão. Fundou, em 1997, o Teatro dos Narradores, onde realizou, entre outros espetáculos, “Cidade vodu” (2016) e “Cidade fim, cidade coro, cidade reverso” (2011). Também colabora como diretor e dramaturgo no grupo Os Crespos. Dirigiu recentemente “Um inimigo do povo” (2022), “As mãos sujas” (2019) e “Navalha na carne negra” (2018). Publicou “Eu, um crioulo” (editora n-1, 2018) e organizou “Próximo ato: teatro de grupo” (Itaú Cultural, 2011), com Antônio Araújo e Maria Tendlau. É autor de artigos e peças em revistas e livros no Brasil, EUA, Alemanha e Espanha. Tem desenvolvido trabalhos também em Berlim. É coordenador da coleção Encruzilhada da editora Cobogó. Desde agosto de 2023, é diretor do Teatro da Universidade de São Paulo.
Atores – Michel Pereira é um ator mineiro residente em São Paulo. Iniciou sua formação em 2013 no GLOBE-SP, coordenado por Ulysses Cruz. Cursou também, em 2017, o NAC – Núcleo de Artes Cênicas, dirigido por Lee Taylor. Em 2018, integrou o Núcleo de Artes Cênicas do SESI SP, sob coordenação de Miriam Rinaldi. Formou-se, em 2023, na Escola de Arte Dramática da Universidade de São Paulo (EAD – ECA/USP). É palhaço, com técnica e aprendizado desenvolvidos no estúdio Oito Nova Dança, com Cristiane Paoli Quito. O artista está no elenco das séries “Chuva Negra” e “A Mesa”, ambas do Canal Brasil e disponíveis no Globoplay. Recentemente, gravou o longa-metragem “Passagrana”, com direção de Ravel Cabral, e a série “Sutura”, para o Star Plus | Lucas Rosário é formado em Artes Cênicas no Conservatório Dramático e Musical Dr. Carlos de Campos, de Tatuí-SP (2011/2013). Em 2014, em Lençóis Paulista, criou o Grupo Tertúlia Teatro, atuando na peça “Quando as Máquinas Param”, de Plínio Marcos. Em 2016, em São Paulo, integrou o espetáculo “O Desconhecido” e iniciou seus estudos no NAC – Núcleo de Artes Cênicas, atuando no espetáculo “Doc.Eremitas” (2016/2017), com direção de Lee Taylor. Atualmente, cursa interpretação na EAD – Escola de Arte Dramática e Letras/Inglês na FFLCH – faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, ambos na USP – Universidade de São Paulo.
Músicos em cena
Mariê Olops é atriz e performer, além de ser pesquisadora do corpo e de vertentes sonoras na dança cênica, na dança cultural, na arte circense e no teatro. Em 2022, passa a integrar o coletivo Teatro da Matilha, compondo o elenco de dois espetáculos encenados em 2023: “Foda-se eu” e “Insolação”. Em junho desse mesmo ano estreia “Rito qualquer para qualquer coisa”, com direção de Tadzio Veiga, no Sesc Pompeia, uma parceria do eixo Fugaz com o Teatro da Matilha. Realiza sua pesquisa sonora como DJ e compositora a partir dos estímulos pulsantes no corpo das intérpretes. Usa como base da investigação o funk e a cena eletrônica do techno paulista como pontos de convergência do seu som.
.
Mateus de Jesus atuou no Teatro do Kaos (2016/2018), em Cubatão. Já participou do coletivo Esquadrilha Marginalia, de teatro de rua, que ocupou o espaço Galpão Cultural (2016/2020). Estudou Humor na SP Escola de Teatro e atualmente cursa a Escola de Arte Dramática (EAD/ECA/USP). Como músico, integrou a banda marcial de Cubatão, o programa BEC e o Conservatório Municipal de Cubatão, transitando entre o canto coral e o trompete.
FICHA TÉCNICA
Espaço cênico, dispositivo de imagem e direção geral: José Fernando Peixoto de Azevedo | Atuação: Michel Pereira e Lucas Rosário | Músicos em cena: Mateus Jesus e Mariê Olops | Operador de câmera: Nycholas Alves | Operador de imagem: Diego Roberto | Assistente de direção: Thaina Muniz | Desenho de luz: Denilson Marques | Cenotecnia: Zito Rodrigues e Nilton Ruiz | Assessoria de imprensa: Canal Aberto | Produção executiva: Michel Pereira | Produção: Corpo Rastreado – Anderson Vieira
SERVIÇO
Dois Perdidos numa Noite Suja – Delivery
De 23 de setembro a 26 de novembro, aos sábados, às 20h30 e, aos domingos, às 18h30
Teatro Aliança Francesa – Rua Gen. Jardim, 182 – Vila Buarque
Ingressos: R$ 60 (inteira), R$ 30 (meia) e R$20 (lista amiga)
Classificação indicativa sugerida: 16 anos
Duração: 90 minutos
Lotação: 50 lugares