COLUNISTAS

Fallahi: as danças do campo – Nati Alfaya

Antes de falar das danças Fallahi, ou mesmo desta população, é preciso entender um pouco a relação entre o rio Nilo e os egípcios.

O Rio Nilo é um dos maiores rios no mundo (disputando esse título com o rio Amazonas, já que ainda não se sabe com certeza qual deles é o maior) e não pode restar dúvidas sobre sua vital importância para o Egito.

Este rio atravessa o país de sul ao norte, garantindo água e terrenos férteis para agricultura e criação de animais por toda sua extensão, é ele que garante a possibilidade de vida no deserto. Por esta razão a grande maioria da população egípcia é ribeirinha, vivendo diretamente em função do rio Nilo. Essa população ribeirinha, embora esteja presente ao longo de todo o rio, está mais concentrada ao norte do país, na região do Delta do Nilo, ou seja, aquela na qual o rio Nilo se subdivide em inúmeros braços antes de desaguar no Mar Mediterrâneo. É nessa região que as águas do Nilo garantem a existência de um solo negro, extremamente fértil.

Embora em cidades maiores como Cairo ou Alexandria, o Egito conte com cidades modernas e uma vida urbana agitada, é verdade também que a maioria da população vive de forma muito mais simples, em zonas rurais, sobrevivendo da agricultura e criação de animais, ou seja, são camponeses.

E são justamente estes camponeses que são o povo chamado de Fallaheen, palavra que significa “aqueles que trabalham na terra”. É deste povo que vêm as danças, músicas, vestimentas e tradições que convencionamos chamar Fallahi.

Esse povo, assim como geralmente é com todos os povos camponeses, são mais conservadores, reservados, ingênuos e tímidos e essas características se refletem em todos os aspectos de sua cultura.

Muitas danças que são apresentadas como danças folclóricas específicas são, na verdade, danças fallahi, uma vez que estas danças retratam as atividades cotidianas da vida no campo. Atividades como colheita de alimentos, por exemplo, deu origem a uma dança fallahi com cestos; a busca de água no rio originou uma dança fallahi com jarros. E Este são apenas dois dos exemplos mais comuns, é possível conceber que existam danças baseadas nem atividades como fazer pães, arar a terra, ou mesmo cuidar dos animais, mas, tendo em vista que este povo é bastante reservado e está afastado das grandes cidades, muito de sua cultura é de difícil acesso.

É preciso perceber, portanto, que não é o mais correto sustentar que exista uma dança DOS jarros ou uma dança DOS cestos, mas sim, danças fallahi COM jarros ou cestos, na medida em que estas retratam o trabalho rural.

Por se tratarem da cultura de um povo de vida bastante simples, a musicalidade reflete essa simplicidade. São músicas alegres e aceleradas, que tem como objetivo deixar o trabalho mais leve, e essa aceleração é dada pela utilização de ritmos binários, ou seja, com apenas 2 tempos. O ritmo mais utilizado, e que, até por conta disso, tem o mesmo nome do povo, é o fallahi (DumTkTa + DumTk). Os instrumentos mais utilizados são a rabeca, a nizmar, a mijwiz e o nay.

É importante ter muita atenção quando se está estudando a música falahhi, isso porque ela tem uma sonoridade muito parecida com as músicas ghawazee, as diferenças normalmente recaem no sotaque ou na temática das letras, que se concentram em falar sobre a vida no campo.

Uma boa dica é procurar por cantoras que são muito típicas, como Fatme Eid ou Fatme Sarhan. Embora não se possa afirmar categoricamente que uma determinada música é fallahi apenas porque são elas cantando, isso dá uma grande margem de probabilidade.
As vestimentas são muito específicas deste estilo de danças. As mulheres do povo fallahi usam vestidos longos e largos, como grandes batas, com mangas longas que normalmente terminam e babados, assim como a barra. Os vestidos do dia a dia são feitos geralmente de algodão, lisos ou estampados com temas florais, para ocasiões especiais pode ser usado o veludo em cores escuras como azul ou roxo. Na cabeça as mulheres sempre usam o Ouyah bi Mandeel, um lenço triangular, de tecido colorido e enfeitado com crochê, contas de vidro ou pompons de lã. O cabelo pode estar todo coberto ou, o que é mais comum, ser preso em duas longas tranças nas laterais. As joias são douradas e em geral discretas, apenas as tornozeleiras (acessório muito típico) são por regra prateadas.

Já os homens usam roupas bastante simples, calças saruel, coletes, camisas leves e podem ou não usar turbantes.

A alegria recatada é marca destas danças e é importante que ela esteja presente no humor, passos e expressões das dançarinas em cena.

Abaixo temos um vídeo que ilustra muito bem as principais características que discutimos aqui, a dançarina Carol Alzei se apresentou no espetáculo Raízes, organizado pela dançarina, coreografa e pesquisadora Nilza Leão em 2014.

Com as danças fallahi nós cobrimos algumas das mais conhecidas danças folclóricas egípcias. A partir da próxima colina começaremos a tratar de danças que costumam ser confundidas com danças folclóricas, embora não o sejam.

Nati Alfaya, dançarina árabe com 10 anos de estudo e prática, parte do grupo Caravana Lua do Oriente – Companhia de Danças Árabes, sediado em Londrina, Paraná, escreve sobre as danças árabes em suas diversas formas tendo um amor especial pelos folclores.

Outros textos de Nati Alfaya:
Nati Alfaya (textos e ensaios)

Facebook: Caravana Lua do Oriente 

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