sexta-feira, novembro 22, 2024

João Ubaldo Ribeiro: “Viva o povo brasileiro”

Um clássico da literatura brasileira, referência internacional da mais competente ficção de nosso país, Viva o povo brasileiro é um romance profundo e arrebatador.

“Viva o povo brasileiro”, exuberante e complexa metáfora da formação de nossa identidade nacional, é obra monumental que já nasceu clássica, instaurando novo olhar ficcional sobre o passado do Brasil. A violência física e simbólica, os abismos sociais e os privilégios que os acentuam, a constituição de uma elite autoritária são encenados ao longo desta narrativa polifônica e lírica, muitas vezes irônica, que cobre quatrocentos anos de história. Poucas obras atingiram esse mesmo nível de complexidade, e pouquíssimas alcançaram êxito semelhante ao de Viva o povo brasileiro.

“Viva o povo brasileiro”, obra de João Ubaldo Ribeiro, vencedor do prêmio Jabuti, em 1984, é um dos mais importantes romances surgidos na literatura brasileira no século XX.

O livro que todo(a) brasileiro(a) deveria ler para compreender a formação do nosso povo, da nossa identidade cultural.

Confira alguns trechos da obra:

Seu poder constituído para mim é merda, suas instituições para mim são bosta. Vocês chamam dinheiro de verba ou numerário, chamam furto de apropriação, nomeação de eleição, assassinato de execução, vocês se vestem fantasiados e usam palavras que julgam bonitas, assim concluindo que seus atos são legítimos. Podem ser legítimos para vocês, mas não para nós, que nunca fomos nem ouvidos nem cheirados e temos de aceitar o que vocês resolvem por nós e até o que vocês pensam por nós. Então, porque aquele que condena um homem à fome e à miséria tem um papel na mão, isso se torna menos imoral, se torna certo de alguma forma? Vocês vêm nos dizer verdades. Que verdade é essa, que nos humilha, nos diminui, nos transforma em nada, como pode ser isso verdade para nós? Para mim vocês são a encarnação da mentira e da morte. Mas, assim mesmo, é nossa prática que possam falar em sua defesa. Contudo, falem em sua defesa e não para nos atacar, porque lhe faço calar a boca outra vez, aqui não temos necessidade das palhaçadas de sua justiça, que arma grandes pantomimas para mascarar o que toda a gente já sabe que fará: punir o pobre e premiar o rico. Portanto, a finalidade de deixar vocês falarem, se quiserem, não é que acreditemos que, falando, vocês deixarão de ser os patifes, traidores do povo, que são. Mas é que podem dizer alguma coisa que nos interesse. Falem, se quiserem.

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— E vocês não se acham ignorantes? Você sabe tecer o tecido que o veste? Sabe curtir, tratar e coser o couro que o calça? Sabe criar, matar e cozinhar o boi que o alimenta? Sabe forjar o ferro de que é feita sua arma? A sua ignorância é maior do que a nossa. Vocês não sabem o que é bom para nós não sabem nem o que é bom para vocês. Vocês não sabem de nós. Chegará talvez o dia em que um de nós lhe parecerá mais estrangeiro do que qualquer dos estrangeiros a quem vocês dedicam vassalagem. O povo brasileiro somos nós, nós é que somos vocês, vocês não são nada sem nós. Vocês não podem nos ensinar nada, porque não querem ensinar, pois todo ensino requer que quem ensine também aprenda e vocês não querem aprender, vocês querem impor, vocês querem moldar, vocês só querem dominar.

 

O ódio que vocês têm ao povo terá que manifestar-se em toda a sua crueldade e, podem crer, o martírio desse povo poderá ser esquecido, poderá não ser entendido, poderá ser soterrado debaixo das mentiras que vocês inventam para proveito próprio, mas esse martírio um dia mostrará que não foi em vão. Terão de matar um por um, destruir casa por casa, não deixar pedra sobre pedra. E mesmo assim não ganharão a guerra. Só o povo brasileiro ganhará a guerra. Viva o povo brasileiro! Viva nós!

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— Isto é que me parece uma insensatez, uma estupidez. Se eu te amo e tu me amas, se nunca nos aconteceu semelhante paixão, semelhante identidade, semelhante fervor, semelhante êxtase, por quê, a troco de quê, nos separaremos?

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— Cale a boca! Aqui não interessa o que o senhor pensa, porque tudo o que o senhor pensa, ou pensa que pensa, é o que lhe puseram na boca e na cabeça, e isso já conhecemos.

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Parece bobagem, mas não é! Temos de ser tudo, mas antes temos de ser nós, entendeu?

Saiba mais:
76 anos de João Ubaldo Ribeiro


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