Não te lembro macia
mas pelo teu amor pesado
eu me tornei
uma imagem da tua carne que já foi delicada
partida em esperas traiçoeiras.
.
Quando chegam estranhos e me saúdam
teu espírito envelhecido faz uma reverência
cintilando de orgulho
mas você já guardou esse segredo
no centro das fúrias
me pendurando
com seios vastos e cabelo áspero
com sua própria carne cindida
e olhos fundos de dor
enterrados em mitos de menor valia.
.
Mas eu descasquei tua raiva
até o cerne do amor
e olha, mãe
Eu Sou
um templo escuro onde teu verdadeiro espírito se eleva
belo
e duro como castanha
pilar contra teu pesadelo de fraqueza
e se meus olhos ocultam
um esquadrão de rebeliões conflitantes
eu aprendi com você
a me definir
por suas negações.
Black Mother Woman
I cannot recall you gentle
yet through your heavy love
I have become
an image of your once delicate flesh
split with deceitful longings.
.
When strangers come and compliment me
your aged spirit takes a bow
jingling with pride
but once you hid that secret
in the center of furies
hanging me
with deep breasts and wiry hair
with your own split flesh
and long suffering eyes
buried in myths of little worth.
.
But I have peeled away your anger
down to the core of love
and look mother
I Am
a dark temple where your true spirit rises
beautiful
and tough as chestnut
stanchion against your nightmare of weakness
and if eyes conceal
a squadron of conflicting rebellions
I learned from you
to define myself
through your denials
.
– Audre Lorde, no livro “Entre nós mesmas: poemas reunidos”. título original “Between ourselves; From a land where other people live; Chosen poems old and new”. tradução Tatiana Nascimento e Valéria Lima. prefácio Cidinha da Silva. Bazar do Tempo, 2020
SOBRE O LIVRO
O livro Entre nós mesmas – Poemas reunidos conjuga três obras fundamentais da trajetória poética da escritora, poeta e ativista norte-americana Audre Lorde, publicadas nas décadas de 1970 e 1980, período de seu maior engajamento pelas causas do movimento negro, LGBT e dos direitos civis nos Estados Unidos. Juntos, Uma terra onde o outro povo vive (1973), Poemas escolhidos – velhos e novos (1978) e Entre nós mesmas (1982), este último que dá nome à edição, apresentam um potente panorama da produção da poesia de Lorde, meio de expressão em que melhor refletiu sobre os temas da opressão social, a violência contra a população negra, a diáspora africana e as referências de sua cultura iorubá, o feminismo, filhos e o amor. “Este Entre nós mesmas nos oferta poemas que, como todos os bons poemas, exigem diversas leituras. Não se trata de uma poesia a ser explicada, contextualizada, mesmo à guisa de introdução, é mesmo fundamental a experiência de lê-la, porque a poesia de Audre Lorde é uma circunferência de ressonância (não cabe em caixas, urge reiterar) da mulher profunda que guardamos, ainda num lugar mais recôndito do que a subjetividade. Uma mulher de múltiplas vozes e infinitas faces, uma mulher-Audre, que nos convida à implicação na transformação do mundo observando as sete direções que a ancestralidade africana nos propõe: à frente e atrás, em cima e embaixo, do lado esquerdo e do lado direito e dentro.”, aponta a escritora Cidinha da Silva, na apresentação do livro. A tradução foi feita por Tatiana Nascimento, poeta, tradutora e editora, juntamente com a também tradutora Valéria Lima. A revisão técnica é de Jess Oliveira e o texto de orelha é de Joice Berth. O livro é bilíngue e traz ainda um glossário dos termos de origem africana presentes na edição, um apanhado das obras de e sobre Andre Lorde publicadas no Brasil e no exterior e uma detalhada nota biográfica da autora.
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FICHA TÉCNICA
Título: Entre nós mesmas: poemas reunidos
Páginas: 224
Formato: 14 x 1.5 x 21 cm
Acabamento: Livro brochura
Lançamento: 31/8/2020 (1ª edição)
ISBN: 978-6586719260
Tradução: Tatiana Nascimento e Valéria Lima
Selo: Bazar do Tempo
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