Novo álbum da série ‘A Música do Brasil’ com Osesp e Antonio Meneses | Villa-Lobos

Está disponível em todas as plataformas digitais, a partir de 22 de setembro, o novo lançamento da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo – Osesp pela série A Música do Brasil, que faz parte do projeto Brasil em Concerto, uma parceria do Instituto Guimarães Rosa, órgão de cultura do Ministério das Relações Exteriores, com três orquestras brasileiras — além da Osesp, fazem parte as Filarmônicas de Minas Gerais e de Goiás —, a Academia Brasileira de Música e o selo Naxos.
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Gravado na Sala São Paulo em abril de 2022, este é o décimo oitavo título da série A Música do Brasil e traz três obras do compositor carioca Heitor Villa-Lobos, o nome mais conhecido internacionalmente da música sinfônica brasileira, interpretadas pela Osesp e pelo violoncelista Antonio Meneses sob a regência do maestro Isaac Karabtchevsky: são elas os Concertos para Violoncelo nº 1 e 2, e a Fantasia para Violoncelo e Orquestra.

“Villa-Lobos sempre nos lembra de que o violoncelo é um instrumento que deve cantar”, diz o solista Antonio Meneses. O Concerto nº 1, de 1915, foi sua primeira grande peça orquestral, contagiante em sua energia juvenil. Em 1945, mais maduro e inspirado pelo estilo fluido do gênero fantasia, Villa dá vida a uma peça criativa e cheia de virtuosismo. Já o Concerto nº 2 (1953) é mais melancólico, sugerindo a solidão do homem diante da imensidão da natureza. “É importante que haja hoje um violoncelista, um maestro e uma orquestra brasileiros gravando essa música da mais alta qualidade, e provando que estas obras são realmente muito importantes”, completa Meneses. O álbum Concertos para Violoncelo nº 1 e 2 • Fantasia para Violoncelo e Orquestra pode ser encontrado em edição física a partir da próxima semana na Loja Clássicos, que fica dentro da Sala São Paulo (piso térreo), e em edição digital já disponível nas mais diversas plataformas de streaming.

Sobre a Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo – Osesp
Fundada em 1954, desde 2005 é administrada pela Fundação Osesp. Thierry Fischer tornou-se Diretor Musical e Regente Titular em 2020, tendo sido precedido, de 2012 a 2019, por Marin Alsop, que agora é Regente de Honra. Seus antecessores foram Yan Pascal Tortelier, John Neschling, Eleazar de Carvalho, Bruno Roccella e Souza Lima. Em 2016, a Orquestra esteve nos principais festivais da Europa e, em 2019, realizou turnê na China. Em 2018, a gravação das Sinfonias de Villa-Lobos, regidas por Isaac Karabtchevsky, recebeu o Grande Prêmio da Revista Concerto e o Prêmio da Música Brasileira. Em outubro de 2022, a Osesp estreou no Carnegie Hall, em Nova York, realizando dois programas – o primeiro como convidada da série oficial de assinaturas da casa, o segundo com o elogiado projeto Floresta Villa-Lobos.

Gravação Osesp, Isaac Karabtchevsky e Antonio Meneses – álbum dedicado Villa Lobos (20.4.2022) – foto © Isadora Vitti

Sobre Antonio Meneses
Antonio Meneses tem uma carreira que inclui apresentações com orquestras como a Filarmônica de Berlim, Concertgebouw Amsterdam, Sinfônica de Londres, Sinfônicas da BBC, de Israel, de Nova York e de São Petersburgo, dividindo o palco com maestros como H. von Karajan, C. Abbado, R. Muti, R. Chailly, Mariss Jansons, Mstislav Rostropóvitch e participações nos festivais de Salzburgo, Lucerna, Viena, Berlim, Praga e Mostly Mozart, entre outros. Sua carreira internacional teve impulso quando venceu o 1º Prêmio e Medalha de Ouro no Concurso Tchaikovsky de Moscou, em 1982. Foi membro do renomado Beaux-Arts Trio e sua grande discografia inclui duas gravações com a Filarmônica de Berlim. Além de se dedicar a uma intensa agenda de concertos, é professor de violoncelo na Hochschule der Künste de Berna e ministra cursos de aperfeiçoamento na Europa, Américas e Japão.

Sobre Isaac Karabtchevsky
Diretor Artístico e Regente Titular da Orquestra Petrobras Sinfônica, é também Diretor Artístico do Instituto Baccarelli e da Orquestra Sinfônica de Heliópolis. Com o projeto de gravação integral das Sinfonias de Villa-Lobos, com a Osesp, conquistou quatro vezes o Prêmio da Música Brasileira (2014-15-16-18). Foi Diretor Musical do Teatro La Fenice (Veneza), da Orchestre National des Pays de la Loire (França) e da Orquestra Tonkünstler (Viena). Desde 2000 é professor no Musica Riva Festival, na Itália.

Sobre a série A Música do Brasil
A série A Música do Brasil faz parte do projeto Brasil em Concerto, desenvolvido pelo Instituto Guimarães Rosa, órgão de cultura do Ministério das Relações Exteriores, com o intuito de promover a música de compositores brasileiros criada a partir do século XVIII. Cerca de 100 trabalhos orquestrais dos séculos XIX e XX serão gravados pela Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo – Osesp e as Filarmônicas de Minas Gerais e de Goiás. Álbuns de música coral e de câmara serão gradualmente adicionados à coleção. Os trabalhos foram selecionados de acordo com sua importância histórica para a música brasileira e a pré-existência de gravações. A maior parte das obras registradas para a série nunca esteve disponível em fonogramas fora do Brasil; muitas outras terão sua estreia mundial em álbuns. Uma parte importante do projeto é a preparação de novas ou primeiras edições dos trabalhos que serão gravados, muitos dos quais, apesar de sua relevância, só estavam disponíveis no manuscrito do compositor. Este trabalho é feito pela Academia Brasileira de Música e por musicólogos trabalhando em parceria com as orquestras.


[Texto de Fabio Zanon sobre o álbum]

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Heitor Villa-Lobos (1887–1959)
Concerto para Violoncelo nº 1 • Concerto para Violoncelo nº 2 • Fantasia para Violoncelo e Orquestra
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Ao conhecer aquela que seria sua primeira esposa, Lucília, uma ótima pianista, um Villa envergonhado por tocar violão confessou a ela que seu principal instrumento era o violoncelo. O episódio demonstra o espaço que cada instrumento teve na sua vida musical: o violão foi o instrumento da intimidade, do vínculo com as tradições populares; o violoncelo foi aquele que o acompanhou por toda sua vida profissional. Com ele, integrou orquestras, tocou em cafés e cinemas, e fez turnês pelo Brasil.
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Suas três obras de larga escala para violoncelo e orquestra foram escritas com grandes intervalos entre elas: 30 anos separam o Concerto nº 1 [1915] da Fantasia para Violoncelo e Orquestra [1945], e oito, esta do Concerto nº 2 [1953].

As circunstâncias da composição do Concerto nº 1, Op. 50, não são bem claras. Ele foi escrito entre 1913 e 1915, para o violoncelista Alfredo Gomes (tio de Iberê Gomes Grosso). A estreia, entretanto, aconteceu em 1919, tendo o jovem Newton Pádua como solista, sob regência do autor. A facilidade proverbial de Villa-Lobos o levou, em um espaço de poucos anos, de um quase total amadorismo, antes de 1913, a uma linguagem orquestral plenamente formulada e original nessa que é a sua primeira grande obra orquestral, o que parcialmente explica a orquestração ambiciosa demais. A concepção trai a inquietude de um compositor em formação, que se debate entre influências várias: a música francesa, na tentativa de forma cíclica; o dramatismo russo, aqui um pouco teatral, ali, leve como um balé; e a escrita virtuosística, que usa o violoncelo em todos os seus registros, talvez influenciada por Popper, um compositor que Villa-Lobos tocava. Apesar de causar a impressão de que há vários compositores numa só obra, o Concerto nº 1 é especialmente atraente por sua energia juvenil, pelos temas fortes e pelas estupendas cadências entre os movimentos, que criam um todo ininterrupto, um pouco à maneira das trilhas sonoras de cinema mudo.
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Nos 30 anos que se seguiram a essa composição, Villa-Lobos foi do anonimato à celebridade internacional. Ao fim da Segunda Guerra Mundial, seu prestígio nos EUA atingiu o pináculo; nos 14 anos seguintes, não se passou um ano sequer sem que ele recebesse alguma encomenda para os palcos norte-americanos. Assim surgiram a maioria de suas sinfonias, da número 7 em diante, a ópera Yerma, a suíte Floresta do Amazonas e vários concertos — para piano, harmônica, violão —, além das duas derradeiras obras concertantes para violoncelo.

Fantasia para Violoncelo e Orquestra foi composta em 1944 e 1945, por sugestão do maestro Walter Burle Marx, e dedicada a Serge Koussevitzky, o que talvez explique o uso inventivo da região grave — Koussevitzky fora um virtuose do contrabaixo em sua juventude. Formalmente, é a obra mais eficiente entre as três: a própria escolha do título Fantasia sugere um Villa-Lobos mais disposto a soltar as rédeas de sua imaginação e deixar com que temas bruscamente contrastados se superponham de forma mais fluente. Os momentos de alta inspiração são muitos, a começar pela ampla melodia, suspensa num soturno ostinato orquestral, logo no início; o virtuosismo delirante do segundo movimento, que é interrompido pela sonoridade primitiva da seção central; ou a derramada ária sertaneja, sobre o acompanhamento orquestral sincopado do terceiro movimento.
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A obra foi estreada no Rio de Janeiro, com Iberê Gomes Grosso como solista, sob a regência do autor, em 1946. Gomes Grosso foi uma figura capital da música brasileira: sobrinho-neto de Carlos Gomes e sobrinho de Alfredo Gomes, estreou mais de cinquenta obras de compositores brasileiros do quilate de Camargo Guarnieri e Santoro.
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Já o Concerto nº 2 foi expressamente encomendado pelo violoncelista brasileiro Aldo Parisot, para sua primeira apresentação como solista da Filarmônica de Nova York, no Carnegie Hall (na ocasião, o regente foi Walter Hendl), em fevereiro de 1955. Parisot manteve por décadas uma carreira de prestígio nos EUA, tendo sido professor em Yale por 60 anos, até falecer em 2018, aos 100 anos de idade. O próprio Parisot narra seu processo de colaboração com Villa-Lobos, que trabalhava melhor sob pressão. Três meses antes da estreia, Villa-Lobos o convidou ao seu quarto de hotel em Nova York para ajustes finais na obra. Das sete da manhã até a noite, Villa-Lobos escrevia, absorto em meio a toda sorte de distrações, enquanto Parisot estudava violoncelo para inspirar o compositor com sua sonoridade. Quando uma passagem era particularmente difícil, Villa pedia que ele a testasse. Dessa forma, a obra ficou pronta em uma semana.

Um Villa-Lobos mais experiente, mas, também, um pouco mais conservador, volta intermitentemente ao tropo da solidão cósmica do ser humano frente à amplidão da natureza, especialmente nos primeiros temas dos dois primeiros movimentos. A adoção da fisionomia musical das Bachianas Brasileiras, no segundo movimento, é uma exceção entre os concertos do autor, provavelmente sugerida por Parisot.
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Um traço constante nos concertos da década de 1950 é a inclusão de uma longa cadência, quase um movimento independente, que faz um apanhado dos temas da obra e anuncia o final; nesse concerto, essa cadência está incorporada ao terceiro movimento e leva a um final de evidente aspecto nacionalista.
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Em Villa-Lobos, fato e narrativa mítica se confundem. Em sua relação com o violoncelo, os dois impulsos convergem: a ideia de que o violoncelo é uma predestinação é comprovada não só pela importância que esse instrumento ocupou em sua vida prática, mas também pelo quanto a voz de violoncelo informa aquilo que hoje ouvimos como “o som” de Villa-Lobos, bem evidente nas obras para conjunto de violoncelos, como as Bachianas números 1 e 5. O instrumento define muito de seu melodismo amplo e complexo e de sua maneira de lidar com as cores específicas de cada registro — entre a rudeza rouca das cordas graves e o tom lamentoso da região aguda —, que se espraiam por toda sua obra orquestral.
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Fabio Zanon
Violonista, professor visitante na Royal Academy of Music, em Londres, e autor de Villa-Lobos (Série “Folha Explica”, Publifolha, 2009). Desde 2013, é o coordenador artístico-pedagógico do Festival de Inverno de Campos do Jordão.

Capa do álbum ‘Heitor Villa-Lobos – Cello Concertos Nos. 1 and 2 / Fantasia for Cello and Orchestra’ • série “A Música do Brasil” • Selo Naxos • 2023

DISCO ‘HEITOR VILLA-LOBOS – Cello Concertos Nos. 1 and 2 / Fantasia for Cello and Orchestra’ • série “A Música do Brasil” • Selo Naxos • 2023
Músicas / compositor
Heitor Villa-Lobos (1887-1959) — 
• Cello Concerto No. 1 – Op. 50 (1915)
1. I. Allegro con brio – Tempo de Gavotte: Moderato –
2. II. Tempo de Gavotte: Assai moderato –
3. III. Allegro moderato
• Cello Concerto No. 2 (1953)
4. I. Allegro non troppo
5. II. Molto andante cantabile
6. III. Scherzo. Vivace – Cadenza –
7. IV. Allegro energico
• Fantasia for Cello & Orchestra (1945)
8. I. Largo
9. II. Molto vivace
10. III. Allegro expressivo
– ficha técnica
Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo – Osesp | Antonio Meneses (violoncelo / solista)  | Regência: maestro Isaac Karabtchevsky | Gravado entre 28 e 27 de setembro/2021 e 18 e 21 de abril/2022 na Sala São Paulo – São Paulo/SP | Produção, engenheiro de gravação e edição: Ulrich Schneider | Assistentes de gravação: Marcio Jesus Torres, Camilla Braga Marciano, Fabio Myiahara | Texto do encarte: Fabio Zanon | Publicação e edição: Éditions Durand-Salabert-Eschig (Univesarsal Music Publishing Classical Group), Paris/FR | Representante: Academia Brasileira de Música | Revisão: Editora da Osesp | Capa: “Geometria espacial” (2022), Maria Lynch (Rio de Janeiro, RJ, 1981) — Imagem gentilmente cedida pela Pinacoteca do Estado de São Paulo | Fotos de encarte: Isabella Matheus | Fotos divulgação: © Isadora Vitti || Parceria: Departamento de Difusão Cultural do Ministério das Relações Exteriores | Selo: Naxos | Catalogo nº: 8.574531 | Formato: CD / Digital | Ano: 2023 | Lançamento: 22 de setembro | #* Ouça o álbum: clique aqui.
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LEIA TAMBÉM
:: Álbum ‘Sinfonia dos Orixás • Pequenos Funerais Cantantes’ – da série ‘A Música do Brasil’ com Osesp e Coro da Osesp
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Série: Discografia da Música Brasileira / Clássica / Erudita / Álbum.
* Publicado por ©Elfi Kürten Fenske

 

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