Gaúcho e universal – Em ‘Gauchada reunida’, o acordeonista Bebê Kramer convoca um time de músicos conterrâneos numa alegre celebração de suas raízes do Sul e dos diálogos para além das divisas regionais, indo do xote de Dominguinhos ao samba-rock de Jorge Ben Jor
– Leonardo Lichote
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Bebê Kramer lembra os fins de semana em família, na cidade gaúcha de Vacaria, onde nasceu: “Sexta no meio da tarde a gente já começava a botar a carne no fogo, a gaita (como o acordeon é conhecido no Sul) pegando… E íamos até domingo, com o último arroz de carreteiro feito com o que tinha sobrado da carne. Um festerê”. É isso que o acordeonista tinha em mente quando escreveu “Gauchada reunida”, música que dá título a seu novo disco.
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“Gauchada reunida”, o disco, é exatamente uma celebração do Rio Grande do Sul. Mas de um Rio Grande do Sul com vocação universal, como a música de Bebê. Não à toa, o artista convidou para estar com ele um time de músicos gaúchos que, de diferentes maneiras, dão robustez à árvore da música do Sul. Uns, na expansão dos galhos em mil direções, como Pedro Franco (violão 7 cordas) e Guto Wirtti (contrabaixo), além do próprio anfitrião. Outros, na firmeza das raízes, caso dos irmãos Paulinho Fagundes (violão 6 cordas) e Ernesto Fagundes (bombo legüero).
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“É uma onda musical que estou tentando desenvolver há uns anos”, conta Bebê. “Porque a música gaúcha tem um caráter mais fechado, de menos comunicação com o resto do Brasil. Músicos como eu, Yamandu (Costa), Guto (Wirtti), a gente tem buscado a responsabilidade de fazer uma música gaúcha mais aberta. Tenho tentado isso nos últimos discos”.
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“Gauchada reunida” carrega esse desejo de comunicação já na origem das composições. Bebê escolheu reunir aí uma leva de músicas em sua maioria feita no violão. “Como tenho muitas limitações no instrumento, acabam saindo coisas mais cancioneiras, melodias mais cantáveis”, explica o artista. “É o que componho depois das 22h, quando não posso mais tocar acordeon pra não incomodar os vizinhos. Ligo meu lado bossa nova, mais mansinho”, brinca.
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Bossa nova é força de expressão, claro. O bombo lagüero, a marcação do baixo, o sotaque gaiteiro e a conversa dos violões garantem o vigor e a assinatura gaúcha, longe do banquinho e da orla carioca. Mas é perceptível o que Bebê chama de “lado mais mansinho” em momentos como “Agosto”, que ele define como um “xote gaúcho”, que vai do tom melancólico de lamento nordestino de um Dominguinhos até um “festerê” de Vacaria.
Ou ainda em “Imensidão”, que assim como a faixa-título, é uma das poucas do disco composta no acordeon. “Mas parece que foi feita no violão”, observa Bebê. “Traz uma paz pro coração, um mar pela frente, um horizonte… Sou apaixonado por essa música”. O lirismo da conversa dos violões nos solos coroa a beleza da melodia.
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“Amizade” carrega também essa serenidade, uma espécie de melancolia pacificada, solar.
Bebê conta que a letra que Iara Ferreira escreveu para a melodia (gravada no disco em versão instrumental) capta exatamente esse sentimento: “Ela fala de uma história de amizade. Como se fosse eu com saudade do meu amigo Gabriel Grossi, que não via há muito tempo por conta de nossos trabalhos, mas que estava presente no dia em que fiz a música”.
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A escolha pelo sul ensolarado, leve, alegre é reafirmada em “Chama a Rita” — já no título, um trocadilho com a dança/ ritmo argentino chimarrita (ou chamarrita). Com sua levada solta com algo de rock (que faz pensar que a Rita pudesse ser a Lee), ela tem “um quê de tertúlia, de sarau”, nas palavras de “Bebê”. Nada é mais festivo, porém, do que “Gauchada reunida”, um vanerão. “Diferentemente de outros gêneros, como a chacarera e o chamamé, vindos de países vizinhos, o vanerão é legitimamente gaúcho. É a síntese da festa gaúcha”.
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Outra que se entrega no título é “Um samba como esse tão legal”, que faz referência ao verso de “Mas que nada”, clássico de Jorge Ben Jor. Nasceu de uma levada de violão simples que ganha um caráter original com o toque do bombo lagüero e os caminhos do acordeon. “É um balanço Jorge Ben dos pampas”, resume Bebê.
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Composta por Bebê para sua irmã há alguns anos, “Fabi” registra um outro momento do compositor, em seus caminhos harmônicos mais intrincados. Apesar da sinuosidade, sua melodia também tem a sedução de canção, do convite ao canto. “Eu estava muito próximo da música de Toninho Horta, dos mineiros… Hoje minhas músicas estão mais simplificadas, mas adoro ‘Fabi’, acho linda”.
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Também mais densa do que o espírito geral do disco, apesar de conversar bem com ele, “Tempestade” visita outro lado da tradição musical gaúcha. De cara, ela estabelece a tensão sugerida no título, das nuvens se fechando no horizonte. O ritmo enérgico (um aire de chacarera, explica Bebê) estabelece uma coesão em meio a seu movimento algo caótico. E enriquece a dinâmica do álbum.
As nuvens negras de “Gauchada reunida”, porém, são passageiras — e mesmo elas carregam uma vibração que inspiram o desejo de se projetar para fora, que atravessa o disco. “Don Euclides”, composta por Bebê, Paulinho Fagundes e Ernesto Fagundes, é exemplo desse desejo. Uma milonga nervosa feita em homenagem a Euclides Fagundes, pai dos parceiros do acordeonista. “Sou fã da família, muito tradicional na música gaúcha”.
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Como o “festerê” é aberto, o disco inclui duas músicas que não foram compostas por Bebê. “Black pantha” é de Pedro Franco. Ela parte da estrutura do aire de chacarera para que o compositor afirme sua originalidade. “Tem essa referência gaúcha, mas harmônica e melodicamente não tem a ver com nada, só com Pedrinho mesmo”, avalia Bebê.
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A outra é “Velho Zé”, alegre homenagem de Guto Wirtti ao compositor Zé Meneses, autor do tema de abertura de “Os Trapalhões”. A música traz esse humor e graça nostálgica de uma era da TV romântica, da comunicação direta e quente que está, no fim das contas, na alma de “Gauchada reunida”.
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“‘Gauchada reunida’ era exatamente o que eu queria fazer hoje. Tive perdas familiares, atravessamos uma pandemia…”, lembra Bebê, antes de sintetizar: “Precisamos de leveza”.
DISCO ‘GAUCHADA REUNIDA’ • Bebê Kramer • Selo Independente • 2023
Músicas/compositores
1. Gauchada Reunida (Bebê Kramer)
2. Chama a Rita (Bebê Kramer)
3. Amizade (Bebê Kramer)
4. Tempestade (Bebê Kramer)
5. Agosto (Bebê Kramer)
6. Fabi (Bebê Kramer)
7. Imensidão (Bebê Kramer)
8. Don Euclides (Bebê Kramer, Paulinho Fagundes e Ernesto Fagundes)
9. Black Pantha (Pedro Franco)
10. Velho Zé (Guto Wirtti)
11. Um Samba como esse tão legal (Bebê Kramer)
– ficha técnica –
Bebê Kramer – acordeom | Paulinho Fagundes – violão 6 cordas | Pedro Franco – violão 7 cordas | Ernesto Fagundes – bombo legüero | Guto Wirtti – contrabaixo || Produção: Bebê Kramer | Direção musical e arranjos: Bebê Kramer | Gravado no estúdio Phalete Underground – Rio de Janeiro/RJ, por Guto Wirtti / em 6 de agosto/2022 | Mixagem e masterização: Gabriel Vieira | Produção executiva: Lílian Macedo | Projeto gráfico: Kate Belli | Assessoria de imprensa: Lílian Macedo | Selo: Independente | Distribuição: Tratore | Formato: CD Digital | Ano: 2023 / Lançamento: 5 de maio | #* Ouça o álbum: plataforma de música. clique aqui!
SOBRE BEBÊ KRAMER
Alessandro Kramer, nasceu na cidade de Vacaria, no estado do Rio Grande do Sul, e começou a tocar acordeon ainda muito jovem, inspirado pelo seu pai, Alencar Rodrigues, um acordeonista bastante conhecido na região. Alessandro, hoje mais conhecido como Bebê Kramer, é considerado um dos maiores acordeonistas do Brasil na atualidade e é um dos nomes mais significativos da nova geração de acordeonistas também no exterior. Como compositor, Bebê apresenta uma estética musical inovadora, na qual traz a expressão de sua fonte inicial, o Rio Grande do Sul, com a junção de outros sotaques, sempre tendo como característica principal sua forte energia ao tocar.
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O começo da sua carreira como músico profissional, aconteceu ainda na adolescência, e ganhou força quando escolheu a cidade de Florianópolis, em Santa Catarina, para ser o palco do seu crescimento musical, vindo a tocar com músicos altamente conceituados, como Guinha Ramires, Alegre Correa, Toninho Horta e Arismar do Espírito Santo. Ainda em Santa Catarina, com outros quatro grandes músicos; Endrigo Bettega, Ronaldo Saggiorato, Guinha Ramires e Mario Conde, Bebê formou a banda chamada Dr. Cipó, com a qual gravou três álbuns que são uma importante referência para músicos e admiradores da música de todo o mundo. O álbum “A Casa”, marca o início de sua carreira solo, tendo as participações de Guinha Ramires, Guto Wirtti e Hamilton de Holanda, com a produção de Alegre Correa.
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Em 2008, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde vive desde então, e este é certamente o lugar onde seus horizontes musicais se expandiram, tornando-o um dos mais renomados músicos no cenário da música instrumental Brasileira hoje em dia. Com Guinha Ramires e Alegre Corrêa gravou, na Áustria, o CD “Laçador”, o qual apresentou em diversos países da Europa e surpreendeu público e crítica. Participou, ao lado de Yamandu Costa, da gravação de um DVD ao vivo, com o qual excursionou pela China e Europa. Gravou o CD “Realejo”, com Gabriel Grossi, trabalho onde desfrutam da intimidade musical que lhes é peculiar. Sua parceria com Toninho Ferragutti resultou no CD “Como Manda o Figurino”, com composições de ambos, e repertório variado.
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Sua versatilidade é destacada no CD “Roda Gingante”, com Arismar do Espírito Santo, Gabriel Grossi, Leonardo Amuedo e Thiago Espírito Santo. Com os músicos Yamandu Costa, Rogerio Caetano e Luis Barcelos, gravou o álbum “Tocata à Amizade” vencedor do Prêmio da Música Brasileira em duas categorias. “Alessandro Kramer Quarteto” seu último trabalho, traz as participações de Guto Wirtti, Luis Barcelos e Sergio Valdeos, e apresenta claramente sua identidade musical, mesclando a tradição da música gaúcha com a ousadia que é sempre tão presente na sua musicalidade. No primeiro, aposta-se num evento e num resultado; um expresso combina vários mostbet pt Nem todos os países permitem apostas. Em alguns países, apostar no desporto é completamente ilegal
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Ao longo da sua carreira, Kramer já gravou e tocou com grandes artistas da música Brasileira e mundial, tais como; Hermeto Paschoal, Guinga, Arismar do Espírito Santo, Toninho Horta, Moraes Moreira, Paulo Moura, Silvério Pontes, Zé da Velha, Hamilton de Holanda, Marco Pereira, Carlos Malta, Yamandú Costa, bem como os acordeonistas Dominguinhos, Osvaldinho do Acordeon e Renato Borghetti.
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Sua música já o levou em turnês por diversos países do mundo como: França, Espanha, Bélgica, Alemanha, Itália, Suíça, Holanda, Israel, China, Angola, Argentina, Liechtenstein e Austria. Nesse último, participou por duas vezes do Festival de Acordeon de Viena, sendo considerado pelos críticos como um dos pontos altos do evento. Com seu notável conhecimento de harmonia e improvisação, Bebê teve sua primeira base, principalmente na música do seu Estado natal, Rio Grande do Sul, e hoje, toca chorinho, samba, tango, jazz e todos os outros estilos musicais com grande desenvoltura.
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DISCOGRAFIA
:: Laçador. Bebê Kramer, Guinha Ramires e Alegre Corrêa (Oficina Records, 2008 / Áustria)
:: A casa. Bebê Kramer (Brasilianos, 2009)
:: Como manda o figurino. Toninho Ferragutti e Bebê Kramer (Borandá, 2011)
:: Realejo. Bebê Kramer e Gabriel Grossi (Independente, 2012)
:: Toca à amizade. Yamandú Costa, Rogério Caetano, Bebê Kramer e Luis Barcelos (Biscoito Fino, 2015)
:: Roda Gingante. Arismar do Espírito Santo / Participação: Gabriel Grossi, Bebê Kramer, Leonardo Amuedo e Thiago Espírito Santo (Maritaca / dist. Tratore, 2015)
:: Alessandro Kramer Quarteto. Bebê Kramer (Borandá, 2017) / Quarteto formado por Kramer, Guto Wirtti, Luis Barcelos e Sergio Valdeos.
:: Vertical. Bebê Kramer (Audio Porto, 2019)
:: Dança do tempo. Teco Cardoso, Bebê Kramer e Swami Jr. (Selo Sesc SP /dist. Tratore, 2019)
:: Yby vol. 1. Vagner Cunha, Bebê Kramer e Paulinho Fagundes (Independente/dist. Tratore, 2021)
:: Simpatia. Yamandu Costa e Bebê Kramer (Independente, 2022)
:: No mesmo barco: Pedro Alcântra convida Bebê Kramer (Independente, 2022).
>> Bebê Kramer na rede: Instagram | Facebook | Youtube | Soptify.
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Série: Discografia da Música Brasileira / Música instrumental.
* Publicado por ©Elfi Kürten Fenske