[Resenha] por Fernanda Machado de Freitas*
Segundo Ítalo Calvino a narrativa fantástica diz muito “sobre a interioridade e sobre a simbologia coletiva”. A narrativa de “O Segredo do Caminho – O Chamado” segue essa trilha, e pavimenta bem essa estrada.
Há uma relação mística entre o autor e a narrativa. Mais especificamente no trajeto percorrido pelo autor no “Caminho de Santiago de Compostela”. A experiência deu a forma de uma história que já existia na alma de Jose Nelson Freitas. Esse caminho foi feito ao lado da esposa Maria da Conceição, em agosto e setembro de 2019. Cidades medievais, mistérios, lendas, contos fantásticos acabam servindo de inspiração. Além de uma infância “antiga”, povoada de histórias narradas oralmente nos sertões nordestinos. Por isso sentimos a presença forte da influência da literatura de cordel.
Trata-se de uma obra que já nasce grande, tão grande que já foi traduzida para dois idiomas: inglês e espanhol.
O início tem como palco, não os sertões dos nordestinos, mas as águas nortistas. Anterior as águas do norte, somos transportados para um ponto no universo. Mais especificamente em uma reunião organizada pelo “Mago Anacom”.
Um trecho da narrativa:
“…longínquos lugares, costumes e características das pessoas, pois teriam que escolher um guerreiro especial e uma mulher especial para coordenar e comandar essa missão e os guerreiros que os acompanhariam. Nessa jornada épica passaram por terras, mares, rios, selvas, florestas e a cada povo que conheciam procuravam identificar se entre eles poderia emergir o “Guerreiro Universal” e os “Guardiões do Colar Universal”.
Há a possibilidade de um desequilíbrio do universo com um futuro alinhamento das galáxias. Há pessoas que podem enfrentar esse problema. Há uma inspiração tolkieniana de mundos diferentes e seres fantásticos. Porém, há o folclore e a lenda brasileira. O autor mira acertadamente os escolhidos nas águas da floresta Amazônica.
Acontece que muitos da comunidade escolhida já tinham alguma consciência desse chamado de tempos remotos. Eis que, o dia chegou.
O casal escolhido é Yakecan e Anahi, dois índios Tupi-Guarani, pinçado pelos Magos para comandar essa jornada épica. Fazem a trilha para uma jornada familiar em sonho, mas inédita e única. A ideia de um sonho acordado permeia os personagens que partem em busca dos tempos e terras desconhecidas. Tendo como única alternativa, seguir.
“Em tudo isso só havia um cantinho de sua mente que ainda lhe pertencia e a luz entrou por ele, como através de uma fenda no escuro; uma luz que vinha do passado e a voz de seu pai que dizia: todo homem é do tamanho do desafio que enfrenta.”
Na história é perceptível a influência da narrativa oral de onde descende os contos de fadas, e das terras que vieram as histórias do “Livro das mil e uma Noites”.
Conforme seguem sua jornada, outros guerreiros de diferentes lugares também atenderam ao chamado e se juntaram a Yakecan e Anahi.
Em seu trajeto, estamos ainda no início da jornada, tomam conhecimento de animais lendários, fantásticos e alguns que estão por aí desde o acontecimento dos mundos. O exército de Yakecan e Anahi já era um grande exército, formado por pessoas que destinariam suas vidas para servir a algo maior que eles. Para isso eles deverão ser tão grandes quanto a questão a enfrentar.
Chamo atenção para a primeira batalha que enfrentaram. A narrativa se faz real dando um panorama do que acontece em campo. É uma descrição viva onde o leitor fica próximo ao que está acontecendo. É uma luta árdua com seres de pedra que brotam de uma montanha. Antes, durante ou depois das batalhas, entre noites e dias, há sempre uma natureza mística, encantadora familiar, dos livros, e misteriosa, da vida.
Outro trecho que tem o poder de nos chamar a atenção é quando o autor descrever o” kuarup”, um ritual praticado pelos índios para reverenciar a memoria dos mortos. A narrativa te coloca dentro do ritual e o momento foi mais que acertado.
E a narrativa segue seu leito…
Os rios cheios borbulham em frenesi, sempre correndo, abrindo caminhos. As árvores que apontam para o sol são visíveis ao leitor que acompanha a saga colossal daqueles que atenderam ao chamado encabeçados por Yakecan e Anahi.
É uma longa jornada, sigamos com os escolhidos.
Título: O segredo do caminho – O chamado
Autor: Nelson Freitas
Ilustrações: Edmilson Cotrim Santos
Sinopse: Nos tempos imemoriais os Magos da antiguidade diziam que um certo dia e hora ocorreria o alinhamento das galáxias e que esse alinhamento poderia ocasionar o desequilíbrio e a destruição do universo…
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*Resenha: Fernanda Machado de Farias, viciada em leitura, escritora, ensaísta e blogueira | Site: Fantasmas solitários.
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