quinta-feira, novembro 21, 2024

‘Quando chorar’, uma crônica de Clarice Lispector

Clarice Lispector em sua reflexão sobre o choro na crônica ‘Quando chorar’.
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Há um tipo de choro bom e há outro ruim. O ruim é aquele em que as lágrimas correm sem parar e, no entanto, não dão alívio. Só esgotam e exaurem. Uma amiga perguntou-me, então, se não seria esse choro como o de uma criança com a angústia da fome. Era. Quando se está perto desse tipo de choro, é melhor procurar conter-se: não vai adiantar. É melhor tentar fazer-se de forte, e enfrentar. É difícil, mas ainda menos do que ir-se tornando exangue a ponto de empalidecer.
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Mas nem sempre é necessário tornar-se forte. Temos que respeitar a nossa fraqueza. Então, são lágrimas suaves, de uma tristeza legítima à qual temos direito. Elas correm devagar e quando passam pelos lábios sente-se aquele gosto salgado, límpido, produto de nossa dor mais profunda.
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Homem chorar comove. Ele, o lutador, reconheceu sua luta às vezes inútil. Respeito muito o homem que chora. Eu já vi homem chorar..

— Clarice Lispector, no livro “A descoberta do mundo”. Rocco, 2020.

SOBRE O LIVRO revistaprosaversoearte.com - 'Quando chorar', uma crônica de Clarice Lispector
As crônicas de Clarice Lispector publicadas no Jornal do Brasil de 1967 a 1973 nos permitem compreender melhor a escritura desta que se consagrou como uma das maiores escritoras do Brasil. Se nos contos e romances o mistério de uma narrativa envolve o leitor num processo quase que iniciático, nas crônicas esse mistério vai aos poucos sendo desvendado, revelando o mundo pessoal e subjetivo da autora enigmática que viveu no Leme, próximo às areias e ao mar de Copacabana, que tanto apreciava.
Ao aceitar o convite do JB para escrever uma coluna aos sábados, Clarice Lispector sente a estranheza entre ser escritora e jornalista: “Na literatura de livros permaneço anônima e discreta. Nesta coluna, estou de algum modo me dando a conhecer”, comenta na crônica de 21 de setembro de 1968.
Gênero leve, ameno, de leitura mais fácil, a crônica traz quase sempre a interpretação de um fato conhecido por todos, investido pela subjetividade de quem comenta o assunto, dando um sabor novo ao acontecido. Com a sua despretensão, a crônica quebra o monumental, o extraordinário, celebrando o cotidiano, o dia a dia e mostra belezas insuspeitáveis através da argúcia, da graça, do humor de quem a escreve. A informalidade investe de leveza uma linguagem cuja densidade busca revelar o segredo das coisas mais simples, o cotidiano transfigurado pelo olhar de Clarice, que redescobre nas Macabéas de todo dia a luminosidade de uma presença estelar. Entre flanelas e vassouras, mulheres simples e humildes se transformam em personagens que se eternizam. Aninha, Jandira, Ivone ou Aparecida são algumas dessas estrelas que saem de suas vidas apagadas para serem reveladas pelo olhar atento e sensível, onde escapa, por vezes, um leve e sorrateiro toque de humor, como no caso da empregada que fazia análise, ou da “mineira calada”, que gostava de ler livros complicados.
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FICHA TÉCNICA
Título: A descoberta do mundo
Páginas: 624
Formato: 21 x 14 x 3.8 cm
Acabamento: Livro brochura
Lançamento: 10/7/2020 (1ª edição)
ISBN: 978-6555320299
Selo: Rocco
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