COLUNISTAS

Quarentena: simbolizações, por Carlos Walker

A simbologia  astrológica (e esotérica) pode em certo sentido ser considerada uma união do mântico, semântico e semiótico.

Os rabiscos do céu e da natureza já habitavam provavelmente as cavernas desde os Homo Erectus, Sapiens e Cro Magnon. Mas até virar alfabeto e linguagem passaram-se muitos éons.

A Astrologia reflete e redesenha as impressões e expressões da humanidade,  no contexto do espaço-tempo e dos níveis de consciência que os seres vão alcançando; ela contém toda a psicologia do mundo civilizado, e veio se adaptando, evoluindo e se ressignificando incessavelmente até chegar aos dias de hoje.

Talvez uma das primeiras manifestações gráficas do pensamento e do mitológico, do raciocínio algébrico e dos eco-cíclicos, em suas indagações sobre a Natureza e o Cosmos.

Gente boa, de mente máster como Jung, Copérnico, Shakespeare, Emerson, Kepler, Pasteur, Paracelso, Platão, Einstein e centenas de outros,  sempre respeitaram o estudo analítico, filosófico e místico da Astrologia.

Ela cruzou os céus dos tempos, diante do olhar encantado dos terráqueos  desde os primórdios de Eras, passou por religiões do antigo Egito,  da Grécia, da Mesopotâmia, dos povos mesoamericanos, dos hindus e chineses, até chegar as telas e logins internáuticos do momento, e aqui, você saboreia virtualmente  pesquisas, fotos e textos de pergaminhos  milenares como  também assiste as astrobaboseiras e almanaques digitais repleto de meras repetições e banalidades.

Cosmografando o zodíaco natural e constelacional, a partir do ponto-de-visão panorâmico do planeta Terra (enquanto por aqui moramos) o sistema astrológico geocêntrico decupa os 360 graus da eclítica, (caminho do sol durante o ano), distribuindo-o em 12 signos (30 graus cada um) e faz analogias e correspondências com as grandes constelações-míticas de mesmo nome, com as órbitas de nossa família planetária, de Sol a Plutão, incluindo a lua e asteroides, convertendo essa macro-linguagem cosmográfica, feita de rotações, translações e nutação em tendências de-e-para cada ser humano, tanto no seu dia-a dia, suas atividades diversas, relacionamentos, idem; como em todo o ambiente  que o circunda.

A Astrologia não é ciência, não é filosofia, nem psicologia. Talvez esteja mais próxima da “Arte da Linguagem” – para ver, pensar e entender a relação entre o mundo íntimo (o que sentimos e somos) com o mundo exposto, o externo, que vivemos.

Os sistemas e operações: algébricas, analíticas, matemáticas da Astrologia graduam-se em formas geométricas e desenham o mapa astral do nativo, com as suas numerações, divisões e correspondências .

E  dentre a ampla tabela de sinais, aspectos, mitos, ritmos, movimentos, elementos  e números está a importância simbólica e conceitual do Número 4 (quatro).

Os 4 pontos cardeais, que darão localização através das longitudes e latitudes, tanto terrestres como celestes. Os 4 Elementos básicos, químicos e alquímicos: Fogo, Ar, Terra e Água, dos quais os signos com seus  ritmos são constituídos, a cruz humana do Mapa: Ascendente (casa 1) Descendente (casa 7), Fundo do Céu (casa 4) e Meio do Céu casa 10.  As 4 fases fundamentais da Lua, nosso satélite regulador de fluxos. As 4 estações do ano. Não só na Astrologia mas em toda simbologia universal, os 4 humores, os 4 ventos, o número sagrado no Veda indiano, dividido em 4 partes. Ou  o ensinamento sobre o Brahma, correspondendo aos 4 domínios do mundo,  assim como os 4 campos das 12 tribos, os 4 Cavaleiros do Apocalipse, e por aí vão inúmeras referências astromíticas e simbólicas da quaternidade.

O Quarenta é uma extensão da raiz do 4. É o número da espera, da preparação ou do castigo (da lição dada pelo tempo devido as atitudes do ser).

Os escritores bíblicos sublinham a história humana com o número QUARENTA.  Salomão e Davi reinam 40 anos, a aliança de 40 dias com Noé  após  o Dilúvio, Moisés é chamado por Deus quando chegou aos 40 anos, e ele passa 40 dias no Monte Sinai, Jesus prega por 40 meses e depois de morto e ressuscitado após 40 horas, reaparece aos seus discípulos durante 40 dias, que precedem sua Ascensão aos Céus. Os hebreus erraram  40 anos pelo  deserto. A Quaresma, uma preparação para a ressurreição da Páscoa  dura 40 dias. E após a Quarentena, em muitos países, os rituais fúnebres cessam e liberam as obrigações dos parentes com o defunto.

Na  Astrologia, dentre os Aspectos Menores (distancia  entre um planeta e outro(s),)  existe um ângulo geométrico de 40 graus chamado novil. Ele não chega a ser considerado um aspecto maléfico, embora de teor saturnino, mas atua entre o psicofísico e o espiritual, nos trazendo um enfrentamento estranho entre os limites do nosso corpo-mente com o nosso espírito-alma, e que diante dessa condição, tenta se libertar para dar um salto. Como uma  Iniciação.

Esse aspecto representa a aceitação de uma condição física, que teve que ser transcendida, abnegada e superada pela  dor, perda ou pela doença. É uma  condição  que já se apercebe de algo transformador, não-físico, mas eletroquímico-energético!!!

O que podemos entender deste aspecto, em tempos assustadoramente virais?

O que presenciaremos e sentiremos nessa Quarentena mundial?

Situações sendo atingidas e impactadas pelo nativo através da meditação, do estudo, do alheamento, do desalento, dor ou DOENÇA. E o nativo terá que sair, se ausentar, se retirar do mundo, enfim, reagir para voltar depois transformado, e caso ainda esteja vivo, terá que servir agora a Humanidade e não mais ao seu ego exclusivamente.

É uma mudança estrutural da consciência, que afeta também o físico em direção aos dons e capacitações metafísicas.

Quem de nós estará preparado para tal missão? Todos aqueles que a conscientizarem.

Percebo nitidamente os conceitos do quatro, do quarenta e da quarentena  neste momento atual, advento terrivelmente macabro do corona-vírus.

Quatro doenças são quarentenárias, a varíola, a peste, a febre amarela e a cólera. A humanidade já vivenciou a lepra, a peste negra, bubônica, a gripe espanhola, a gripe suína, atravessou por inúmeros surtos, epidemias e pandemias no carretel dos séculos. Exorcizou miasmas coletivos, práticas de fumigamento e desinfecção, junto as fogueiras purificadoras, nas encruzilhadas das cidades; desinfetou com perfumes e enxofre os indivíduos, as residencias, roupas e outros objetos. As noções de contágio já estiveram associados aos espíritos, demônios, algo que entra no corpo feito dardos na forma de vírus lançados pelos deuses, etc., sendo necessário o isolamento e a expulsão para o retorno do equilíbrio e a harmonia integrais.

Repararam como repetimos padrões e apenas mudamos os nomes das pandemias? Será que ainda estamos em quarentena, presos no barco medieval dos tempos longínquos?

O simbolismo dessa quarentena, que toda a humanidade enfrenta agora, é de ordem planetária e universal. Para algumas pessoas e países poderá ser  de apenas 40 dias, para outros pode durar 40 semanas ou 40 meses, mas para a grande maioria, terá a consequência de 40 anos, já que condições sociais e econômicas são determinantes e fulminantes neste mundo do deus capitalista.

Se 4 é o número da estabilidade e do centro, e essa base agora vem se desmoronando, teremos que nos reinventar íntima e externamente, física e mentalmente, emocional e espiritualmente. Desenvolver no silencio da nossa  interioridade, a intuição. Gratuitamente.

Eu sei que não devemos apenas matematizar a vida e os conhecimentos, mas devemos sim, nos basear  nos ciclos, nos números, nas letras das  estrelas,  na terra, no fogo, o ar, nos ventos, na atmosfera,  nas águas, florestas  e  nos bichos com uma definitiva ferramenta, a nossa “bússola de avisos”.

Só assim essa Quarentena poderá ter valido todas as perdas. Só assim a nossa vida e passagem pela Terra terão valido a pena.

***

Carlos Walkerou simplesmente Wauke. Músico, Escritor e Astrólogo há 40 anos. Carlos Walker começa a cantar em 1969 através de Festivais no Brasil. Têm livros publicados e discos gravados.

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