“Mascarada: Zé Keti”, fruto do encontro do Sergio Krakowski Trio com Jards Macalé em Nova Iorque, é o mais novo lançamento da Rocinante, já disponível em todas as plataformas digitais e em breve, em vinil. Nele, o cantor/violonista Jards, o pandeirista Sergio, o pianista Vitor Gonçalves e o guitarrista Todd Neufeld levam a música de Zé Keti até aquela curva depois da qual a música se faz silêncio.
“Mascarada”, em texto de Sergio Krakowski
Ebó. Exú foi. Quem nos colocou juntos nessa estrada? Meu filho Caetano, na abertura de seus dois anos, quando no zoológico, viu Hipopótamo, Tamanduá, Jacaré e espalhafatosas Araras. Maravilhamento foi o caminho. Dentro de um carrinho vermelho bem velho e maltrapilho, o que o fazia vibrar era o ir e vir, os buracos, as subidas e rápidas descidas de zoeira que levavam de um bicho a outro. Aqui, o mesmo. De um samba a outro, o que nos leva é a estrada misteriosa que não se deixa revelar de uma só vez. Durante a gravação deste disco, Caetano estava na barriga da Aline, e o mundo ainda era aquele anterior. Anos antes, vivia em Nova Iorque, encruzilhada onde conheci Todd, apresentado por meu amigo Vitor. Fundamos o trio e, depois de um primeiro disco autoral, começamos a interpretar sambas que nos faziam felizes. Eu falei: nosso próximo disco será de samba!
Todd veio: e que tal Zé Keti interpretado por Jards Macalé? Lembrei: uma noite nos idos tempos em que tocava no Anjos da Lua, capitaneado por Eduardo Gallotti, no Clube Democráticos, Lapa, subiu Macalé no palco. Os silêncios (sempre eles) me pegaram.
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Todo o não dito da interpretação do Jards – aquilo era a magia que buscávamos. Fechou. Em novembro de 2019, com o apoio da Rocinante, o projeto se tornou real, escolhemos um repertório que, ao mesmo tempo que grita Opinião e Acender as Velas, também se vela nos silêncios da nossa Mascarada. Ao mesmo tempo que samba miudinho em Peço Licença ou dolente em Meu Pecado, reza em Prece.
Essa última vai em tributo ao Walter Franco, outro mestre dos caminhos que nos deixou em 2019. De improviso, pedimos carona à abertura, no carrinho vermelho e velho, meio aos trancos e barrancos, mirando o chão, pra de resvalo, quem sabe, acertar o céu.
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“Peço licença, mas eu não mudo de opinião: Zé Keti, o lendário poeta e melodista, não acaba de ser traduzido: acaba de ser transcriado.”
DISCO ‘MASCARADA: ZÉ KETI’ • Sergio Krakowski Trio e Jards Macalé • Selo Rocinante • 2024
Canções / compositores
Lado A
1. Acender as velas (Zé Keti)
2. Opinião (Zé Keti)
3. O meu pecado (Zé Keti e Nelson Cavaquinho)
4. Improvisação (Jards Macalé, Todd Neufeld e Sergio Krakowski)
Lado B
5. Mascarada (Zé Keti e Elton Medeiros)
6. Prece de esperança (Zé Keti)
—– citações de Walter Franco
7. Peço licença (Zé Keti)
– ficha técnica –
Jards Macalé (violão e voz) | Sergio Krakowski (pandeiro) | Todd Neufeld (guitarra) | Vitor Gonçalves (piano) || Direção artística e produção musical: Sergio Krakowski e Todd Neufeld | Gravação: Pepê Monnerat no Brooklyn Recording (NY) | Mistura: Duda Mello | Masterização: Eric Boulanger (The Bakery) | Coordenação artística: Jhê | Projeto gráfico: Ana Rocha | Capa obra de: Iberê Camargo / sem título, 1976 (giz de cera e nanquim sobre papel) © Fundação Iberê | Fotografia: Aline Müller | Texto: Sergio Krakowski | Produção executiva: Luanda Morena e Pepê Monnerat | Selo: Rocinante | Formato: CD Digital / LP | Ano: 2024 | Lançamento: 17 de janeiro | ♪Ouça o álbum: clique aqui
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SOBRE JARDS MACALÉ
Desafinar o coro dos contentes parece ter sido tarefa que o carioca Jards Macalé assumiu para si. Quando pedimos a delicadeza, ele nos traz o ruído; quando o esperamos delirante, lá vem ele reverente, sempre como se dissesse: Eu só faço o que quero – aliás, título de sua biografia escrita por Fred Coelho.
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Falar da trajetória de Jards é um passeio à memória da música e da cultura brasileira. Dos encontros com uma Maria Bethania recém-chegada da Bahia no Rio, as colaborações com Vinícius de Moraes, Nara Leão, Clara Nunes, a presença e participação na bossa nova, no tropicalismo, no pós-tropicalismo e na própria construção do Brasil democrático que conhecemos. Macalé tem sua biografia atravessada por tantos grandes nomes, como Caetano Veloso, Gal, Paulinho, Chico Buarque, Milton Nascimento, Edu Lobo, Frejat e Raul Seixas. Tem ainda uma forte representação também no cinema nacional, assinando trilhas sonoras de clássicos como Amuleto de Ogum e Tenda dos Milagres de Nelson Pereira dos Santos, onde também participa como ator. Também colaborou na trilha de Macunaíma de Joaquim Pedro de Andrade. Foi ator em curtas e longas como Tira os Óculos e Recolhe o Homem, de André Sampaio e Big Jato de Cláudio Assis, além de ser o mote dos documentários Jards, um morcego na porta principal de Marcos Abujamra e João Pimentel e Jards de Eryk Rocha.
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Depois de jogar xadrez na Sala Cecília Meirelles com John Cage, cantar com Jackson do Pandeiro, dividir projetos com Naná Vasconcelos (o álbum Let’s Play That), com Guinga, Zé Renato e Moacyr Luz (o show/DVD Dobrando a Carioca) e com vários artistas da cena recentíssima da canção brasileira (Juçara Marçal, Ava Rocha, Kiko Dinucci, Rômulo Fróes, Rodrigo Campos, Tim Bernardes e outros que surgem em Besta Fera, de 2019), Macalé ampliou ainda mais o rol de seus parceiros, dividindo pela primeira vez um trabalho com o lendário pianista e compositor João Donato: Síntese do Lance – lançado por nossa gravadora Rocinante em 2021. Esse “encontro de dois iconoclastas de estirpe”, segundo a definição do crítico Tárik de Souza, foi indicado ao Grammy Latino na categoria de Melhor Álbum de Música Popular Brasileira de 2022.
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Seguindo o embalo Rocinante, uma das próximas empreitadas do artista será o disco “Mascarada”, em que Jards Macalé e o trio do pandeirista Sergio Krakowski oferecerão ao ouvinte interpretações “free líricas” de sambas de Zé Keti.
SOBRE SÉRGIO KRAKOWSKI E TRIO
De um pandeirista carioca, talvez sejam esperadas coisas diferentes das que Sergio Krakowski faz. Em suas mãos, o pandeiro, sem deixar de ser ele próprio, vira surdo, rum, tamborim e bateria eletrônica; trama polirritmias, borda contrapontos e interfere nas harmonias. Krakowski vem criando toda uma poética nucleada nesse tradicional instrumento. Uma poética: um discurso coeso e aberto a riscos que, ao longo dos anos, multiplica suas linhas de investigação e se desdobra nos mais diversos trabalhos.
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Enquanto descobria batidas de funk com Sany Pitbull, dividiu cena fazendo choro com pegada contemporânea no Tira Poeira e rodou a Europa com workshops de percussão, Sérgio acumulou ainda os diplomas de Bacharel e Mestre em Matemática pela UFRJ e um doutorado em Computação Musical, onde se dedicou ao desenvolvimento de softwares que permitem que o pandeiro controle a projeção de vídeos, a geração de loops e efeitos, estabelecendo um diálogo em tempo real entre percussionista e máquina.
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Entre a academia e a música, Sérgio experimentou misturar funk com choro, teve parcerias com nomes com Elza Soares, discos pela gravadora Biscoito Fino, apresentações nos Estados Unidos e Europa. Em 2016, lançou seu primeiro disco, A Fundação da Ilha, onde faz registro da sua imersão no universo das modulações métricas – fator estruturante da música dos batás da santeria cubana, aqui aplicado sobre repertório de lavra própria.
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Mascarada é o segundo trabalho do trio, em ode aos sambas lendários de Zé Keti com interpretação sensível somada à voz e violão de Jards Macalé. O resultado? Uma fricção de estilos ásperos em torno de um repertório clássico
SOBRE A GRAVADORA E FÁBRICA ROCINANTE
A gravadora e fábrica de discos de vinil Rocinante foi criada em 2018, em Petrópolis. Trata-se do fruto do encontro de Sylvio Fraga com o conhecimento técnico do engenheiro de som Pepê Monnerat. A gravadora lança discos em vinil e em formato digital, com destaque para a canção e música instrumental brasileira na composição de seu catálogo. O disco de vinil de qualidade produz um som especial – sem compressão – e é, portanto, um meio de reprodução importante para os objetivos da gravadora: expressar a singularidade e intenções estéticas de cada artista. “Nossa bússola é a comoção diante do que ouvimos. Atuamos principalmente nos campos da canção e da música instrumental brasileiras. Lançamos os discos em vinil, prensados na nossa própria fábrica com prensas modernas Newbilt, e também em formato digital”, comenta Sylvio Fraga, músico e sócio.
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No romance “Dom Quixote” de Cervantes, Rocinante é o nome do cavalo do protagonista. Portanto, de acordo com os sócios, a gravadora é uma aventura que se assume quixotesca. No pool de artistas representados pela gravadora, o brilhantismo de Jards Macalé, Bernardo Ramos, Erika Ribeiro, João Donato, José Arimatéa, Marcelo Galter, Ilessi, Nelson Angelo, a obra de Letieres Leite + Quinteto / Orquestra Rumpilezz, Thiago Amud e o próprio Sylvio Fraga.
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Série: Discografia da Música Brasileira / MPB / Canção / Samba / Jazz / Álbum.
* Publicado por ©Elfi Kürten Fenske
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