MÚSICA

‘Síntese do Lance’, um álbum necessário de João Donato e Jards Macalé

Álbum de João Donato e Jards Macalé ‘Síntece do Lance’ traz dez temas, entre cantados e instrumentais, e vibra para cima.
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“A música deveria ser vendida em farmácia. É um ótimo remédio contra a tristeza”, disse Donato ao Estadão.
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Quando a síntese de João Donato se mistura ao lance de Jards Macalé
Um nasceu no Acre, em 1934. O outro, no Rio de Janeiro, em 1943. Um foi expoente da bossa nova com o plus das fusões jazzísticas. O outro, um farol sempre na vanguarda, com talentos múltiplos e muitas histórias para contar. De 1960 para cá, os dois cruzaram acordes com quase todos os grandes nomes da nossa música popular e lançaram discos essenciais. Curiosamente, as trajetórias fluíram em paralelo. Até SÍNTESE DO LANCE (Rocinante), o álbum que chegou às plataformas no dia 22 de outubro (2021), com amostras da amizade recente de João Donato e Jards Macalé.
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SÍNTESE DO LANCE traz dez temas, entre cantados e instrumentais, e vibra para cima. “É um caleidoscópio sonoro que alivia as tensões. A cada audição, aparecem outros detalhes. Estou feliz”, afirma Macalé. Feliz é um bom adjetivo para a bolacha, a terceira lançada pela Rocinante este ano, o terceiro de atividade da nova gravadora que está calibrando as engrenagens para inaugurar fábrica própria de elepês.
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“Queríamos gravar um disco com o Donato e tínhamos acabado de gravar um com o Jards interpretando Zé Kéti, que lançaremos em breve. Um dia deu um estalo e imaginei os dois compondo, tocando e cantando juntos: eles toparam na hora! Um sonho”, comemora o poeta e músico Sylvio Fraga, co-produtor do disco com o sócio Pepê Monnerat e o trombonista Marlon Sette, que também fez os arranjos de metais.
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Esse convite foi uma dádiva. “Desde muito jovem, quando comecei a gostar de música, sou fã incondicional de João Donato. Era um dos quatro músicos que mais ouvia, ao lado de Johnny Alf, João Gilberto e Tom Jobim. Fui muito amigo desses três e Donato era quem faltava na minha coleção de amizades”, pontua Macalé. “Estar perto do Macalé é uma coisa maravilhosa! Fica sempre esse clima de alegria. O nosso encontro é pura bem-aventurança”, exulta Donato.

João Donato e Jards Macalé – foto ©Leo Aversa

Um balanço latinoamericano
“Côco Táxi” é a primeira parceria destes senhores com alma de criança e foi um dos singles lançados para anunciar o álbum. Em diferentes momentos, eles já andaram no Côco Táxi, um triciclo envolto por um grande côco, pitoresco meio de transporte usado por turistas em Havana, Cuba. “O João me mandou um tema para finalizar: veio o ‘côco táxi, côco louco’ e uma segunda parte bem a cara dele. O que fiz foi entrar na dança e completar a letra”, conta o carioca da Tijuca.
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“Lembrei das andanças no Malecon, uma avenida enorme que cruza Havana, entre o mar verde e um azul profundo no céu. É um veículo inseguro. A cada esquina parece que ele vai virar”, diverte-se Macalé, para quem a música que inaugurou para valer a parceria com Donato traz um saboroso “balanço cubano latinoamericano”.
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As outras nove faixas nasceram individualmente – Macalé compôs “João Duke” e “Lídice” (feita abraçado ao violão, numa rede, na pequena cidade homônima, no interior do Rio, quando o casal visitava uma amiga) – e com outros parceiros, caso de “Um abraço do João” (Macalé e Joyce), “Ontem e hoje” (Macalé e Sylvio Fraga), “Caruru” (Sylvio e Marlon Sette) e “Açafrão” (Donato, Sylvio e Marlon).

Chama a atenção o carinho que os músicos fazem em suas companheiras. “Dona Castorina”, a segunda faixa do disco, o pianista dedica à Ivone Belém, com quem está casado há 22 anos. “O amor vem da paz” (primeira parceria a ser gravada de Macalé e Ronaldo Bastos, letrista de imensa delicadeza) sela a década de união do violonista com Rejane Zilles.
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A música corre fácil João Donato conta que estava folheando um caderno de composições e encontrou uns rabiscos com o título “Síntese do Lance” e trechos de partitura que apontavam para um ponto de umbanda. Donato chamou o Marlon Sette para completar o esboço. “Marlon escreveu uma segunda parte muito bonita e ficamos muito alegres com essa música. Tudo o que nos alegra é mais do que bem vindo!”, exulta.
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A certa altura, um coro não planejado entra em ação. “Foi espontâneo. Todas as pessoas que estavam no estúdio, os instrumentistas, Rejane e Ivone, foram chamados a cantar. Virou um congraçamento, já que foi a nossa última sessão no estúdio da Rocinante, em Araras”, rebobina Macalé.
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Ao falar sobre a música que batiza o álbum, ele define muito bem o lançamento como um todo: “O que é a síntese do lance? Extrair o néctar, o âmago das coisas. É ir direto ao ponto. A música corre fácil, fazendo a vida ficar mais simples e foi inspirada na entidade do Zé Pelintra”. Salve essa novíssima dupla da nossa MPB!

Capa do álbum ‘Síntese do lance’ • João Donato & Jards Macalé • Rocinante • 2021

DISCO ‘SÍNTESE DO LANCE’ • João Donato & Jards Macalé • Rocinante • 2021
Canções/ compositores:
disco 1
1. Côco táxi (Jards Macalé e João Donato)
2. Dona Castorina (João Donato)
3. Ontem e hoje (Sylvio Fraga e Jards Macalé)
4. Cururu (Sylvio Fraga e Marlon Sette)
5. João Duke (Jards Macalé)
disco 2
6. Síntese do lance (Tradicional / adapt. João Donato e Marlon Sette)
7. Açafrão (João Donato, Marlon Sette e Sylvio Fraga)
8. Um abraço do João (Joyce Moreno e Jards Macalé)
9. O amor vem da paz (Joyce Moreno e Jards Macalé)
10. Lídice (Jards Macalé)
-ficha técnica –
Jards Macalé (voz – fx. 1, 3, 5, 6, 8, 9; violão – fx. 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10) | João Donato (voz – fx. 1, 4, 6, 7; piano – fx. 1, 2, 7, 10; rhodes – fx. 3, 4, 5, 6, 8, 9) | Guto Wirtti (baixo acústico – fx. 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10) | Sylvio Fraga (guitarra – fx. 1, 4, 6) | Pepê Monnerat (guitarra – fx. 9) | José Arimatéa (trompete – fx. 1, 4, 7, 9, 10; flugelhorn – fx. 2; trombone – fx. 4, 9) | Marlon Sette (trombone – fx. 1, 5, 6, 9; mellotron – fx. 9) | Bidú Cordeiro (trombone baixo – fx. 4) | Diogo Gomes (trompete – fx. 4) | Júlio Merlino (flauta – fx. 9) | Kainan do Jêje (bateria – fx. 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10) | Luizinho do Jêje (percussão – fx. 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 9, 10) | Neném da Cuíca (percussão – fx. 3, 4, 5, 6) || Coro (fx. 6): a banda, Bráulio Passos, Carolina Cooper, Daniela Kupek, Edu Costa, João Atala, Ivone Belem, Rejane Zilles, Felipe Duriez, Pepê Monnerat, Vinicius Crivellaro e Wallace Gomes || Produzido por: Marlon Sette, Sylvio Fraga e Pepê Monnerat | Direção musical: Marlon Sette | Produção executiva: Luanda Morena e Nuala Brandão | Gravação: Pepê Monnerat, Edu Costa e Bráulio Passos no Estúdio Rocinante | Mistura: Pepê Monnerat no Estúdio Rocinante | Masterização: Alexandre Rabaço | Manutenção de equipamentos: Vinicius Crivellaro | Assistência de estúdio: Felipe Duriez | Afinação do piano: Tienes | Projeto gráfico: Ana Rocha | Fotografias da capa e do pôster: Leo Aversa | Fotografias internas: João Atala | Texto: Tárik de Souza | Selo Rocinante | Formato: Digital / LP cat.: R011 | 2021 / outras edições: CD selo Think! Records (Japão) / cat.: THCD603 / 2022 | #* Ouça o álbum: Spotify | Deezer | Tidal  | Apple Music

João Donato e Jards Macalé – foto ©Leo Aversa

O encontro de dois iconoclastas de estirpe por Tárik de Souza  – O acreano João Donato e o carioca Jards Macalé escrevem eloquentes capítulos à parte na história da MPB, e têm suas longevas e densas carreiras de exceção entrelaçadas. Precursor da bossa, Donato foi parceiro de João Gilberto (Minha Saudade) e levou o movimento para uma clave rítmica caribenha, além de produzir Gal Costa (Cantar) e tecer com Caetano Veloso, Nua Idéia (que prenunciou o bem humorado “nude” da dupla, na capa) e com Gilberto Gil, Lugar Comum. Parceiro do bossanovista Vinícius de Moraes (O mais que perfeito) e diretor musical de Maria Bethânia, no início da carreira, Jards Macalé produziu Caetano (Transa) e desdobrou o tropicalismo em sua morbeza romântica, protagonizada por Gal (Vapor barato, Mal secreto). Mas, contrariando a tese pueril, essas duas afiadas trajetórias paralelas acabaram se encontrando, nos cabalísticos 87 anos de um e 78 de outro, neste intenso Síntese do lance.
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Músicos, arranjadores, compositores e intérpretes, eles só poderiam interagir com um requintado elenco instrumental como o da gravação. Em Síntese do lance (Donato / Marlon Sette / canção popular), a sincopada faixa título, o núcleo base da banda brilha: além do suingue dos cantores Donato (também Rhodes) e Macalé (também violão), temos Marlon (trombone), Neném da Cuíca, Guto Wirtti (baixo) e a dupla baiana de pai e filho, Luizinho do Jêje (percussão) e Kainan do Jêje (bateria), protagonistas da Orkestra Rumpilezz, do recém falecido luminar do afro-jazz baiano, Letieres Leite. Especialistas em dilatar fronteiras, João & Jards sacodem esqueletos na parceria afro/pop/jazz/caribenha (e o que mais venha) Côco táxi (“é nesse balanço louco que eu fico solto”), triscado pelo trompete de José Arimatéa. Dele também é o desenho do sopro atilado da instrumental Lídice (Macalé), de mote central recorrente, com o autor ao violão e Donato no piano.
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Além de co-produtor do disco, Sylvio Fraga toca algumas guitarras e faz parcerias com Macalé na bossa intimista Ontem e hoje (“mas quem é você pra me dizer / tudo que devo esquecer?”), e divide a autoria na sinuosa Cururu (“no meio da mata é o tiro é o tiro / que sobe no cheiro do ralo”) com o trombonista e também co-produtor Marlon Sette. Os dois ainda pincelam a apoteose Açafrão, a seis mãos com Donato, titular de voz e piano na faixa: “até na calha eu vi mamão brotar / também já vi pitanga dando num Corcel”. O terceiro co-produtor do disco é Pepê Monnerat, que assina também a gravação e mixagem.
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As duas musas conjugais dos astros são celebradas na sintaxe lírica funkiada de O amor vem da paz, de Macalé (com Ronaldo Bastos), e na instrumental Dona Castorina, de Donato, num bolero compassado, para dançar colado. Numa narrativa instrumental bossajazzística, Macalé promove o link do parceiro do disco com o papa da orquestração do jazz em João (Donato) Duke (Ellington). E incensa ainda, em co-autoria com Joyce Moreno, o artífice de todas as bossas em Um abraço no João, o Gilberto. Uma verdadeira síntese do lance do disco e de sua modernidade sem amarras, a serviço de dois iconoclastas de estirpe. “Um abraço desses não / não é pra qualquer violão / é pra quem conhece o dom / e passa pra outra geração / tudo o que esse abraço quer / é tocar seu coração”.

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João Donato e Jards Macalé – foto ©Leo Aversa

Sobre o álbum Síntese do Lance na mídia:
BARBOSA, Daniel. O disco que não foi feito para ganhar dinheiro nem para conquistar. In: Estado de Minas, 22.10.2021. Disponível no link. (acessado em 19.5.2021).
BITTENCOURT, Julinho. “A Síntese do Lance”, de João Donato e Jards Macalé, um álbum imprescindível. In: Revista Fórum, 22.10.2021. Disponível no link. (acessado em 19.5.2021).
CASSESE, Patrícia. João Donato e Jards Macalé trazem ‘Síntese do Lance’ à capital mineira. In: O Tempo, 15.6.2022. Disponível no link. (acessado em 19.5.2023)
CORREIO DO POVO. João Donato e Jards Macalé lançam “Síntese do Lance”. In: Correio do Povo, 18.12.2021. Disponível no link. (acessado em 19.5.2021).
DOLZAN, Marcio. Parceria entre Jards Macalé e João Donato é um álbum que levou 60 anos para ser gravado. In: Estadão Conteúdo, 22.10.2021. Disponível no link. (acessado em 19.5.2021).
ESSINGER, Silvio. João Donato e Jards Macalé lançam primeiro trabalho juntos, ‘Síntese do lance’, disco só de músicas inéditas. In: O Globo, 26.10.2021. Disponível no link. (acessado em 19.5.2021).
FERREIRA, Mauro. Musicalidade de João Donato se impõe sobre universo de Jards Macalé no primeiro álbum conjunto dos artistas. In: G1/Globo, 23.10.2021. Disponível no link. (acessado em 19.5.2023)
LEAL, Claudio. Jards Macalé e João Donato se unem em álbum que celebra a bossa nova. In: Folha de S. Paulo, Ilustrada, 21 de outubro 2021. Disponível no link. (acessado em 19.5.2021).
LIMA, Irlam Rocha. Encontro memorável: João Donato e Jards Macalé juntos em ‘Síntese do lance’. In: Correio Braziliense, 24.10.2021. Disponível no link. (acessado em 19.5.2023)
LISBOA, Bruno. Ao vivo: Com bom humor e clássicos, João Donato e Jards Macalé cativam público n’A Autêntica, em Belo Horizonte. In: Sreamyell, 16.6.2022. Disponível no link. (acessado em 19.5.2023)
MARTINELLI, Roberta. ‘Som a Pino Entrevista’ com Jards Macalé e João Donato: “Amanhã vai ser melhor do que hoje”. In: Som a Pino ‘podcast’. Rádio ELdorado / Estadão, 16.12.2021. Disponível no link. (acessado em 19.5.2023)
OLIVEIRA, Anderson. Resenha: João Donato e Jards Macalé – Síntese do Lance. In: Passagem de Som, 4 de fevereiro 2022. Disponível no link. (acessado em 19.5.2021).
PEIXOTO, Mariana. João Donato e Jards Macalé chegam a BH com a ‘Síntese do lance’. In: Estado de Minas, 15.6.2022. Disponível no link. (acessado em 19.5.2021).
SESC. João Donato & Jards Macalé lançam “Síntese do Lance” no Sesc Pinheiros para o Música #EmCasaComSesc, dezembro/2021. Disponível no link. (acessado em 19.5.2023)
VILA NOVA, Leonardo. Síntese do Lance de Jards Macalé e João Donato. In: Revista Continente, 10.11.2021. Disponível no link. (acessado em 19.5.2021).
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Leia também:
:: Jards Macalé celebra 80 anos e lança o disco ‘Coração Bifurcado’
:: João Donato apresenta ‘Serotonina’, seu primeiro álbum solo de canções
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João Donato: Instagram | Facebook | Instituto João Donato
Jards Macalé: Site Oficial | Instagram | Facebook
Rocinante: Site Oficial | Instagram | YouTube | LinkTree
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Série: Discografia da Música Brasileira / MPB / Canção.
* Publicado por ©Elfi Kürten Fenske

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