Soneto
Dama
sem tanto ardor embora ainda flamante
A rosa que cruel ou lacerada e lassa
Se deveste do alvor que a púpura deslaça
Para em sua carne ouvir o choro do diamante
Sim sem crises de orvalho antes em doce alento
Nem brisa o fragor do céu leve ao fracasso
Com ciúme de criar não sei bem qual espaço
No simples dia o dia real do sentimento,
Não te ocorre, talvez, que a cada ano que passa
Quando em tua fronte se alça o encanto ressurreto
Basta-me um dom qualquer natural de tua graça
Como na alcova o cintilar de um leque inquieto
A reviver do pouco de emoção que grassa
Todo o nosso nativo e monótono afeto.
1887
.
Sonnet
Dame
sans trop d’ardeur à la fois enflammant
La rose qui cruelle ou déchirée et lasse
Même du blanc habit de pourpre le délace
Pour ouïr dans sa chair pleurer le diamant
Oui sans ces crises de rosée et gentiment
Ni brise quoique, avec, le ciel orageux passe
Jalouse d’apporter je ne sais quel espace
Au simple jour le jour très vrai du sentiment
Ne te semble-t-il pas, Mary, que chaque année
Dont sur ton front renaît la grâce spontanée
Suffise selon quelque apparence et pour moi
Comme un éventail frais dans la chambre s’étonne
À raviver du peu qu’il faut ici d’émoi
Toute notre native amitié monotone.
1887
– Stéphane Mallarmé, no livro “Poesia da recusa”. [organização e tradução Augusto de Campos]. Coleção signos 42. São Paulo: Editora Perspectiva, 2006.
§
Cansado do ócio amargo…
Cansado do ócio amargo onde meu tédio humilha
A gloria que me fez perder outrora a trilha
De uma infância de bosques e de rosas, puro.
Azul matico e, ainda mais, do pacto duro.
De cavar toda noite uma fossa imponente
No território avaro e hostil da minha mente,
Coebeiro impiedoso da esterilidade,
– Quer dizer a esta Aurora, ó Sonho, infinidade
De rosas, se, temor de suas rosas frias,
O vasto cemitério une as valas vazias? –
Quero deixar a Arte voraz deste país
Cruel, e sem ouvir as críticas senis
Dos meus amigos, do passado, da poesia,
Da lâmpada que sabe da minha agonia,
Imitar o chinês de alma límpida e fina
Cujo êxtase puro é pintar a ruína
Sobre taças de neve à lua subtraída
De uma bizarra flor que lhe perfuma a vida
Fluida, a flor que ele sentia ainda criança,
E à filigrana azul do espirito se entrança.
E como a morte, único sonho do saber,
Sereno, uma paisagem cálida escolher,
Que eu pintarei, indiferente, sobre a taça.
Uma linha de azul fina e pálida traça
Um lago, sob o céu de porcelana rara,
Um crescente caído atrás da nuvem clara
Molha no vidro de água um dos cornos aduncos
Junto a três grandes cílios de esmeralda, juncos.
1864
.
Las de l’amer repos…
Las de l’amer repos où ma paresse offense
Une gloire pour qui jadis j’ai fui l’enfance
Adorable des bois de roses sous l’azur
Naturel, et plus las sept fois du pacte dur
De creuser par veillée une fosse nouvelle
Dans le terrain avare et froid de ma cervelle,
Fossoyeur sans pitié pour la stérilité,
– Que dire à cette Aurore, ô Rêves, visité
Par les roses, quand, peur de ses roses livides,
Le vaste cimetière unira les trous vides? –
Je veux délaisser l’Art vorace d’un pays
Cruel, et, souriant aux reproches vieillis
Que me font mes amis, le passé, le génie,
Et ma lampe qui sait pourtant mon agonie,
Imiter le Chinois au coeur limpide et fin
De qui l’extase pure est de peindre la fin
Sur ses tasses de neige à la lune ravie
D’une bizarre fleur qui parfume sa vie
Transparente, la fleur qu’il a sentie, enfant,
Au filigrane bleu de l’âme se greffant.
Et, la mort telle avec le seul rêve du sage,
Serein, je vais choisir un jeune paysage
Que je peindrais encor sur les tasses, distrait.
Une ligne d’azur mince et pâle serait
Un lac, parmi le ciel de porcelaine nue,
Un clair croissant perdu par une blanche nue
Trempe sa corne calme en la glace des eaux,
Non loin de trois grands cils d’émeraude, roseaux.
1864
– Stéphane Mallarmé, no livro “Poesia da recusa”. [organização e tradução Augusto de Campos]. Coleção signos 42. São Paulo: Editora Perspectiva, 2006.
§
Pafos – um nome só…
Pafos – um nome só do fundo da memória,
Meus livros já fechados, longe, me fascina
Das espumas querer salvar uma ruína
Sob os jacintos de seus vãos dias de glória.
Que corra o frio com a sua foice muda.
Nenhuma nênia inócua urlará minha boca
Se vórtice tão branco ao rés do chão não muda
Todo lugar no honor de uma paisagem oca.
Minha fome que aqui fruto nenhum exalta
Encontra igual sabor em sua douta falta:
Que um só rebento em carne humana e odorante!
Pé sobre a serpe de onde o nosso amor sazona,
Um outro sobreleva o meu pensar constante:
O seio a que abrasou uma antiga amazona.
1887
.
Mes bouquins refermés…
Mes bouquins refermés sur le nom de Paphos,
Il m’amuse d’élire avec le seul génie
Une ruine, par mille écumes bénie
Sous l’hyacinthe, au loin, de ses jours triomphaux.
Coure le froid avec ses silences de faux,
Je n’y hululerai pas de vide nénie
Si ce très blanc ébat au ras du sol dénie
A tout site l’honneur du paysage faux.
Ma faim qui d’aucuns fruits ici ne se régale
Trouve en leur docte manque une saveur égale:
Qu’un éclate de chair humain et parfumant!
Le pied sur quelque guivre où notre amour tisonne,
Je pense plus longtemps peut-être éperdument
A l’autre, au sein brûlé d’une antique amazone.
1887
– Stéphane Mallarmé, no livro “Poesia da recusa”. [organização e tradução Augusto de Campos]. Coleção signos 42. São Paulo: Editora Perspectiva, 2006.
§
Triunfalmente a fugir…
Triunfalmente a fugir o belo suicida,
Tição de glória, espuma em sangue, ouro, tormenta!
Oh! riso se me chama a púrpura perdida
Ao cortejo real da tumba que me tenta.
Não! de todo o fulgor nem mesmo se sustenta
Um brilho, é meia-noite e a sombra nos convida,
Salvo o tesouro audaz que uma cabeça ostenta
No mimado torpor sem lume em que é servida.
A tua, sempre, sim, delícia que me vem,
A única que do céu extinto ainda retém
No meu pentear, pueril, um pouco da triunfante
Luz, quando a pousas, só, entre as dobras sedosas,
Capacete imortal de imperatriz infante
De onde, para espelhar-te, choveriam rosas.
1885
.
Victorieusement fui…
Victorieusement fui le suicide beau
Tison de gloire, sang par écume, or, tempête!
Ô rire si là-bas une pourpre s’apprête
A ne tendre royal que mon absent tombeau.
Quoi! de tout cet éclat pas même le lambeau
S’attarde, il est minuit, à l’ombre qui nous fête
Excepté qu’un trésor présomptueux de tête
Verse son caressé nonchaloir sans flambeau,
La tienne si toujours le délice! la tienne
Oui seule qui du ciel évanoui retienne
Un peu de puéril triomphe en t’en coiffant
Avec clarté quand sur les coussins tu la poses
Comme un casque guerrier d’impératrice enfant
Dont pour te figurer il tomberait des roses.
1885
– Stéphane Mallarmé, no livro “Poesia da recusa”. [organização e tradução Augusto de Campos]. Coleção signos 42. São Paulo: Editora Perspectiva, 2006.
§
Tristeza de verão
O sol, na areia, aquece, ó brava adormecida,
O ouro da tua coma em banho langoroso,
Queimando o seu incenso em tua face aguerrida,
E mistura aos teus prantos um filtro amoroso.
Desse branco fulgor a imóvel calmaria
Te faz dizer, dolente, ó carícias discretas,
“Jamais nós dois seremos uma múmia fria
Sob o antigo deserto e as palmeiras eretas!”
Porém os teus cabelos, rio morno, imploram
Para afogar sem medo a nossa alma triste
E encontrar esse Nada que em teu ser não medra.
Degustarei o bistre que teus cílios choram
Para ver se ele doa àquele que feriste
A insensibilidade do azul e da pedra.
1864
.
Tristesse d’été
Le soleil, sur le sable, ô lutteuse endormie,
En l’or de tes cheveux chauffe un bain langoureux
Et, consumant l’encens sur ta joue ennemie,
Il mêle avec les pleurs un breuvage amoureux.
De ce blanc Flamboiement l’immuable accalmie
T’a fait dire, attristée, ô mes baisers peureux,
“Nous ne serons jamais une seule momie
Sous l’antique désert et les palmiers heureux!”
Mais ta chevelure est une rivière tiède,
Où noyer sans frissons l’âme qui nous obsède
Et trouver ce Néant que tu ne connais pas!
Je goûterai le fard pleuré par tes paupières,
Pour voir s’il sait donner au coeur que tu frappas
L’insensibilité de l’azur et des pierres.
1864
– Stéphane Mallarmé, no livro “Poesia da recusa”. [organização e tradução Augusto de Campos]. Coleção signos 42. São Paulo: Editora Perspectiva, 2006.
Stéphane Mallarmé – o poeta e seu tempo
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© Pesquisa, seleção e organização: Elfi Kürten Fenske em colaboração com José Alexandre da Silva
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