Para Viviane Mosé*, episódio não pode ser tratado como caso isolado
O assassinato de uma moradora de rua não pode ser visto como um caso isolado. O Rio está violento, mas o mundo todo está violento. E é uma violência quase gratuita, sem motivo aparente e importante. É a violência do nosso tempo, em que os limites estão perdendo o sentido. Vivemos uma época de transição de modelo de sociedade. A sociedade atual é ligada por rede. Agora, todo mundo se conecta. E as pessoas ficam meio perdidas. Em alguns casos de terrorismo, por exemplo, não existe uma causa religiosa. Nessa sociedade conectada, não se sabe o que é ser um homem, uma mulher ou uma criança. Hoje, um menor sustenta sua família com um blog. Vivemos a exaustão humana.
O fato é que as pessoas estão odiando a si mesmas e ao próximo. O período é muito difícil. O que justifica um menino matar colegas de escola? Bullying ? Esse não é um motivo para tamanha violência.
Sou defensora das novas mídias. Mas entendo que precisamos nos reorganizar e nos transformar para viver nesses novos tempos. Temos que reaprender a ser seres humanos e a conviver em grandes grupos.
Estamos em transição, entre um mundo que nasce e o outro que desaba. Por isso, temos que reaprender a ser, a conviver, a fazer acordos, a nos frustrar, temos que reaprender a respeitar, a considerar o outro, temos que reaprender a nos divertir. E isso é papel da educação, que não pode mais ser reduzida apenas à escola. Educar deve ser papel de toda a sociedade. Investir no ser humano é hoje uma urgência.
Mais do que conteúdos e informação, disponíveis facilmente, necessitamos de formação humana. Os pais não estão mais em casa com os filhos, e então eles têm que aprender mais cedo a ter autonomia, o que implica em ter responsabilidades. Estudar por projetos de pesquisa é a melhor metodologia para as escolas, eu penso, para desenvolver seres humanos mais autônomos e responsáveis. Mas, acima de tudo, temos que estimular as pessoas para a vida, precisamos resgatar a alegria de apenas e simplesmente viver.
Enfim, estamos tendo que reaprender a viver, e isso não é ruim. Um prédio em ruínas, afinal, se parece com um prédio em construção. E a busca deve ser sempre por uma sociedade menos desigual economicamente e mais justa. Ou nos destruiremos em uma guerra de nós contra nós mesmos.
*Viviane Mosé é filósofa, psicóloga e psicanalista. Saiba mais AQUI!
Fonte: O Globo